- A MÚSICA DO INEXORÁVEL
1.
oiço o eco da sua voz nua - sob o quarto escurecido - o som da chuva rasteira - em meio às naves - a pedra do ilegível - dormente - sobre a luz trémula contemplo - as ravinas e os montes - a alta torre - a hybris em minha mente - pródiga em azul -
2.
- relutante ao "trotskismo eliotiano" - advogo a prática visionária - uma arte crédula - formal - o evento quântico - no que tento exprimir - ignoro - a primazia da prima philosophia - resta-me o pântano metafísico e a via láctea - perder-me na assimetria das crateras - a matemática dúplice -
3.
toco a luz sonânbula dos holofotes - a ardósia e a neve - sinto-me perdido - junto a um livro de épicuro - reproduções das drip-paintings de pollock - rebolo-me no ávido - o incissivo - dentro do que se repercute - penso nas marés-vivas - num espelho e em whithead - a dualidade sem dualismo - a matéria e o vacuum -
4.
quem vislumbra - minhas pupilas cerradas - sob a boina vasca - desde o início o sumptuoso - o peso do incurável - no alento - da imortalidade - a voragem do desvario - as imagens que desfilam na retina - enquanto aceleras ? -
5.
- rumo ao dócil - imóvel - sobre o edredão inabalável - busco o impetuoso - o milagre profano - no encalço de uma gota de chuva - botticelli - a penúria do exangue - o proscrito corpo - na opacidade do irredimível - ? -
6.
- ela franze os pulsos e reclina os tornozelos - sob a manta roxa - em chamas - conivente - me concede abrigo - para lá da vicissitude - a música do inexorável - furta-se à sonolência da erva - sobre o inconsolável - ?
Porto, 21 Dezembro 2009
segunda-feira, 21 de dezembro de 2009
quinta-feira, 17 de dezembro de 2009
A TÚLIPA EM CHAMAS
- A VOZ DO IRREDUTÍVEL
1.
sob os penhascos um promontório
o contorno de uma torre alucinada
um rasgão a luz molhada do horizonte
a cabeça de uma cabra soerguendo-se
2.
quem balança em rodopio no cume de ardósia
junto ao que resvala galga o imprevisível
sorve em funda lama e a geada o céu aquoso?
3.
diz-me a altivez imóvel das pedreiras
sob a lousa oblíqua o sucinto passado
junto ao que ignoro o hálito da voz irredutível
o ouro que se oculta na túlipa em chamas
as sebes no ar a giesta esquiva inexpressiva
1.
sob os penhascos um promontório
o contorno de uma torre alucinada
um rasgão a luz molhada do horizonte
a cabeça de uma cabra soerguendo-se
2.
quem balança em rodopio no cume de ardósia
junto ao que resvala galga o imprevisível
sorve em funda lama e a geada o céu aquoso?
3.
diz-me a altivez imóvel das pedreiras
sob a lousa oblíqua o sucinto passado
junto ao que ignoro o hálito da voz irredutível
o ouro que se oculta na túlipa em chamas
as sebes no ar a giesta esquiva inexpressiva
MANHÃ DE PRATA
- VOZ DO TERRESTRE
1.
resta-me soletrar o rumor do mar em meio às naves- vislumbrar o livro do inóspito - retomar o exausto- o que se desvanece no ouro - da folhagem - as nuvens do oriente -
2.
o que assoma no alto da montanha - resvala silencioso - quase me faz acreditar na voz do terrestre - a égua branca - na escuridão - a torre de areia na manhã de prata ? -
3.
sob essas nuvens do céu - o que perpassa voraz - me enebria - teu corpo - entre a luz e a pedra da demência - incandesce -
4.
através do desabitado - a altivez da cabra nua - a inteira blasfémia - junto ao que soçobra - o mais ínfimo corpo - na penumbra -
Porto, 19 Dezembro 2009
1.
resta-me soletrar o rumor do mar em meio às naves- vislumbrar o livro do inóspito - retomar o exausto- o que se desvanece no ouro - da folhagem - as nuvens do oriente -
2.
o que assoma no alto da montanha - resvala silencioso - quase me faz acreditar na voz do terrestre - a égua branca - na escuridão - a torre de areia na manhã de prata ? -
3.
sob essas nuvens do céu - o que perpassa voraz - me enebria - teu corpo - entre a luz e a pedra da demência - incandesce -
4.
através do desabitado - a altivez da cabra nua - a inteira blasfémia - junto ao que soçobra - o mais ínfimo corpo - na penumbra -
Porto, 19 Dezembro 2009
sexta-feira, 4 de dezembro de 2009
UM MAR DE LILASES
- LIBÉLULA, PRAÇA DE PEDRA
1.
em caminha retive as imagens da insensatez - na órbitra do incêndio - adormeci -
junto às velhas muralhas - sobre as quatro vigas - do atelier - abeirei-me do improvável - a morna sonolência das pedreiras - os juncos -
2.
sou safo catulo e villon - moisés e elias - o porto e a baía - no seu corpo convulso -
a maresia - o tigre astucioso e o cipreste - a desvanecida alga - em chamas - sobre um livro -
a areia exacta e a fímbria da pedra - a libélula esquiva - a coroa astral -
a voz recôndita e a praça dourada - de pó - a música do incompreensível -
o que se esvai - na onda viril - do intacto - a página branca - a cegueira do visível -
3.
quem se inscreve nesta viagem - pelos albergues da loucura - fome do sedento -
caminha sobre um mar de lilases - os cardos - pelo inconstante - a lanterna da prece - as imagens do límpido? -
4.
no calor das águas furtadas - vislumbrei - a sua cabeleira solta - a loucura secreta - da sereia -
suspenso na nudez tremente - infranqueável - contemplei - o seu sexo - clarão - sob o céu obscurecido -
por detrás do lençol - os ombros - o mais fremente -
5.
no desvalido corpo - da pintura - o ouro do sabat - um freixo - a voz diáfana -
a pedra opaca - sobre a luz dos relâmpagos – que sobe do meu peito - o granizo - penetrando nos ossos - ?
6.
permaneces quase a descoberto - numa voz escondida - repassada de cal - na erva húmida -
o fuscado pelo pudor - a lâmpada muda - mar anunciado - azul exultante - onde a pietas habita - o grito - entre aberto ?
Porto, 4 Dezembro 2009
1.
em caminha retive as imagens da insensatez - na órbitra do incêndio - adormeci -
junto às velhas muralhas - sobre as quatro vigas - do atelier - abeirei-me do improvável - a morna sonolência das pedreiras - os juncos -
2.
sou safo catulo e villon - moisés e elias - o porto e a baía - no seu corpo convulso -
a maresia - o tigre astucioso e o cipreste - a desvanecida alga - em chamas - sobre um livro -
a areia exacta e a fímbria da pedra - a libélula esquiva - a coroa astral -
a voz recôndita e a praça dourada - de pó - a música do incompreensível -
o que se esvai - na onda viril - do intacto - a página branca - a cegueira do visível -
3.
quem se inscreve nesta viagem - pelos albergues da loucura - fome do sedento -
caminha sobre um mar de lilases - os cardos - pelo inconstante - a lanterna da prece - as imagens do límpido? -
4.
no calor das águas furtadas - vislumbrei - a sua cabeleira solta - a loucura secreta - da sereia -
suspenso na nudez tremente - infranqueável - contemplei - o seu sexo - clarão - sob o céu obscurecido -
por detrás do lençol - os ombros - o mais fremente -
5.
no desvalido corpo - da pintura - o ouro do sabat - um freixo - a voz diáfana -
a pedra opaca - sobre a luz dos relâmpagos – que sobe do meu peito - o granizo - penetrando nos ossos - ?
6.
permaneces quase a descoberto - numa voz escondida - repassada de cal - na erva húmida -
o fuscado pelo pudor - a lâmpada muda - mar anunciado - azul exultante - onde a pietas habita - o grito - entre aberto ?
Porto, 4 Dezembro 2009
sábado, 28 de novembro de 2009
A INDECIBILIDADE, O ALTO

- PUNCTUATED EQUILIBRIA
1.
Não me escrevas - deslumbra - meu corpo que se desdobra -
Junto a Shelley - a veracidade da demência - em Rotterdam - minha vocação da penúria - inconfessada -
Sou o Circum Mundo - o Alto - que não vês - o Quantum Chaos - a confrontação - o incessante -
Desde a Suméria até Sefarad - já conheci o êxodo - a falácia do verbo - indispensável -
Sou espanto desnudo do caminho - Epiménides - a nuvem herética - o ininterrupto -
O rumor de um largo escrito - na orla da noite - a partitura iluminada -
Sou o prado e a cabra luminosa - o que sussurra - a boca muda de Riemann -
A voz que prescinde dos números primos e a trepadeira imóvel - no Vale de Loire -
O indemonstrável - o penhasco e o osso - Gramsci - um cervo ferido -
Sou o canto indizível - num espectro de pedra - um diagrama antigo - Asclépio - Hermes - Serápio -
Uma luz sonolenta e o orvalho inconsistente - o céu a descoberto -
A neve e a erva dócil junto da cisterna - a música do incorrigível -
Sou a abóbada e a nave do incêndio - Notre Dame - os partigiani -
Cada manhã - sob a voz obscura que finda - Kurt Godel -
2.
Sou a verdade e a mentira - a indecidibilidade - o sétimo mandamento -
O éter e o jovem Euclides enlouquecido - o chapéu de David Hilbert -
Por sobre o bosque ermo - o relâmpago - sob os carvalhos -
Apenas vejo o vago e o fugaz - quando o incêndio espreita -
Sobre a cúpula da catedral - o impenetrável Charles Sanders Peirce -
3.
Sou o corpo inabalável - de Kavafis - um jovem inerme e sonânbulo - o frenesi do anónimo me possui -
Imune ao deserto – o pueril – a urgência estética – meu coração se detêm -
Quem se atreve a renunciar – cede ao que clama – o jovem Kafka – a erva e o vento – o alusivo -
Persiste no ópio - a fala minuciosa e a escuta - a voz do lúcido – a inconsistência -
Quem em Palo Alto - renuncia aos dias futuros - a equação do impróprio - a quebrada luz -
Do esplendor - se apressa - sobre o mar - confinado ao desejo e a ímpia nudez - o grito ocre -
Quem cerrando os olhos - permanece perante o impossível - no desamparo metafísico -
Sobre a cisterna - a lâmpada - os lábios do sedento - ?
4.
Sou a cláusula celeste - a voz do prematuro - o Brahma - Nada Absoluto -
Permaneço nesse êxtasse - a convulsão - junto a Emily Dickinson - a Via Láctea -
Sou o mapa - o relâmpago – a música do contraditório – o não – e – a intangibilidade -
Rendido ao alento da loucura - junto ao muro da inexpressão - escuto o vazio - que tudo inclui - Caravagio -
Na língua do silêncio - o som primigénio - na noite - de John Cage -
O relinchar do potro - no ar - o sal desnecessário - a circunferência sobre o orvalho -
Sou a Arca da Aliança - a pedra inclassificável - o clinâmen - o precipício distinto -
Na incumbência do deserto - o que se desmorona - incendeia -
1.
Não me escrevas - deslumbra - meu corpo que se desdobra -
Junto a Shelley - a veracidade da demência - em Rotterdam - minha vocação da penúria - inconfessada -
Sou o Circum Mundo - o Alto - que não vês - o Quantum Chaos - a confrontação - o incessante -
Desde a Suméria até Sefarad - já conheci o êxodo - a falácia do verbo - indispensável -
Sou espanto desnudo do caminho - Epiménides - a nuvem herética - o ininterrupto -
O rumor de um largo escrito - na orla da noite - a partitura iluminada -
Sou o prado e a cabra luminosa - o que sussurra - a boca muda de Riemann -
A voz que prescinde dos números primos e a trepadeira imóvel - no Vale de Loire -
O indemonstrável - o penhasco e o osso - Gramsci - um cervo ferido -
Sou o canto indizível - num espectro de pedra - um diagrama antigo - Asclépio - Hermes - Serápio -
Uma luz sonolenta e o orvalho inconsistente - o céu a descoberto -
A neve e a erva dócil junto da cisterna - a música do incorrigível -
Sou a abóbada e a nave do incêndio - Notre Dame - os partigiani -
Cada manhã - sob a voz obscura que finda - Kurt Godel -
2.
Sou a verdade e a mentira - a indecidibilidade - o sétimo mandamento -
O éter e o jovem Euclides enlouquecido - o chapéu de David Hilbert -
Por sobre o bosque ermo - o relâmpago - sob os carvalhos -
Apenas vejo o vago e o fugaz - quando o incêndio espreita -
Sobre a cúpula da catedral - o impenetrável Charles Sanders Peirce -
3.
Sou o corpo inabalável - de Kavafis - um jovem inerme e sonânbulo - o frenesi do anónimo me possui -
Imune ao deserto – o pueril – a urgência estética – meu coração se detêm -
Quem se atreve a renunciar – cede ao que clama – o jovem Kafka – a erva e o vento – o alusivo -
Persiste no ópio - a fala minuciosa e a escuta - a voz do lúcido – a inconsistência -
Quem em Palo Alto - renuncia aos dias futuros - a equação do impróprio - a quebrada luz -
Do esplendor - se apressa - sobre o mar - confinado ao desejo e a ímpia nudez - o grito ocre -
Quem cerrando os olhos - permanece perante o impossível - no desamparo metafísico -
Sobre a cisterna - a lâmpada - os lábios do sedento - ?
4.
Sou a cláusula celeste - a voz do prematuro - o Brahma - Nada Absoluto -
Permaneço nesse êxtasse - a convulsão - junto a Emily Dickinson - a Via Láctea -
Sou o mapa - o relâmpago – a música do contraditório – o não – e – a intangibilidade -
Rendido ao alento da loucura - junto ao muro da inexpressão - escuto o vazio - que tudo inclui - Caravagio -
Na língua do silêncio - o som primigénio - na noite - de John Cage -
O relinchar do potro - no ar - o sal desnecessário - a circunferência sobre o orvalho -
Sou a Arca da Aliança - a pedra inclassificável - o clinâmen - o precipício distinto -
Na incumbência do deserto - o que se desmorona - incendeia -
quinta-feira, 26 de novembro de 2009
BODE - RELÂMPAGO - ALTA VEREDA ESCURA
- RÉSTIA DO BRANCO
1.
sob o bosque de névoa - o relâmpago - junto do regato - inacessível - para lá da escarpa - um bode saltitante - abeira-se do abismo - despenha-se - do alto -
2.
aqui a vereda escura e turva nuvem - o descampado - que me cobre - a nave - hermética - da insónia -
3.
o âmago da pedra sobre nada - o som do ignoto - um bafo ecoando - na neve -
4.
perco-me na réstia do branco e o orvalho furtivo - a montanha - o resplendente pêlo - os chifres sem nome - na noite - suas órbitras piedosas -
5.
sobre o augúrio - a sombra endemoniada - que acena sobre o que incendeia - uma árvore desbastada -
Porto, 26 Novembro 2009
1.
sob o bosque de névoa - o relâmpago - junto do regato - inacessível - para lá da escarpa - um bode saltitante - abeira-se do abismo - despenha-se - do alto -
2.
aqui a vereda escura e turva nuvem - o descampado - que me cobre - a nave - hermética - da insónia -
3.
o âmago da pedra sobre nada - o som do ignoto - um bafo ecoando - na neve -
4.
perco-me na réstia do branco e o orvalho furtivo - a montanha - o resplendente pêlo - os chifres sem nome - na noite - suas órbitras piedosas -
5.
sobre o augúrio - a sombra endemoniada - que acena sobre o que incendeia - uma árvore desbastada -
Porto, 26 Novembro 2009
quarta-feira, 25 de novembro de 2009
O INOLVIDÁVEL GATO
- SILENTE
O inolvidável gato – persa - espírito aclarado - se distende - sobre o meu peito - defronte ao cabalete - súbito no branco - da tela - a orla da noite - altivo - permanece - silente - através da luz - no atelier - em esboço - vou filtrando sua impávida retina - concentrada -
O inolvidável gato – persa - espírito aclarado - se distende - sobre o meu peito - defronte ao cabalete - súbito no branco - da tela - a orla da noite - altivo - permanece - silente - através da luz - no atelier - em esboço - vou filtrando sua impávida retina - concentrada -
PITAGÓRICA TRAMA
- DO IRRESOLUTO
Quem emerso no irresoluto - se expõe - no branco - ouro e azul -
Permanece pelo apaziguado - a premeditada geometria -
Pitagórica trama - flama – força e desvelo - sombra amena -
Faz brotar a luz - a voz do prolixo – o imerso corpo - da pintura -
Na constância da pedra desnuda - a nave - fixa o inexplícito
Junto ao que se dissipa - ténue brilho - a divina proporção -
Quem emerso no irresoluto - se expõe - no branco - ouro e azul -
Permanece pelo apaziguado - a premeditada geometria -
Pitagórica trama - flama – força e desvelo - sombra amena -
Faz brotar a luz - a voz do prolixo – o imerso corpo - da pintura -
Na constância da pedra desnuda - a nave - fixa o inexplícito
Junto ao que se dissipa - ténue brilho - a divina proporção -
segunda-feira, 23 de novembro de 2009
O CORPO, SONO LEVE
- VOZ DO INSOLÚVEL
1.
diz-me o que assoma na retina - ténue luz – desfocada - sobre o branco da tela - a nudez reflectida - imagem após imagem - a música e a pedra - inacessível -?
2.
contemplo o que se esvai - no traço - do áreo - tua oculta fisionomia - o corpo - sono leve – que me incendeia - a voz do insolúvel - o que ascende -
1.
diz-me o que assoma na retina - ténue luz – desfocada - sobre o branco da tela - a nudez reflectida - imagem após imagem - a música e a pedra - inacessível -?
2.
contemplo o que se esvai - no traço - do áreo - tua oculta fisionomia - o corpo - sono leve – que me incendeia - a voz do insolúvel - o que ascende -
O CORPO SOBRE A LUZ EMUDECIDA
- O IMPONDERÁVEL
1.
sob o que cessa - o incisivo corpo -
junto ao que tarda - o que se esvai -
na pedra sobre a luz emudecida
2.
o branco que aflui e ilumina a voz
- do imponderável - quando te despes -
o ímpeto da beleza - inapreensível - ?
Porto, 23 Outubro 2009
1.
sob o que cessa - o incisivo corpo -
junto ao que tarda - o que se esvai -
na pedra sobre a luz emudecida
2.
o branco que aflui e ilumina a voz
- do imponderável - quando te despes -
o ímpeto da beleza - inapreensível - ?
Porto, 23 Outubro 2009
terça-feira, 17 de novembro de 2009
O ALTO DA MONTANHA, A CABRA
- O INDESCRITÍVEL
1.
Por trás do brilho da pedra - a luz do inexorável -
O alto da montanha - o ilimitado - que a céu aberto se perfilha -
A neve espessa - que assoma na retina - indescritível -
Sobre a nuvem - o musgo - uma cabra - reflectida -
2.
No abismo - de mansinho roçando - eu vi-te - em fuga - junto à lâmpada imóvel -
Pelo desfiladeiro - o azul do aéreo - na despercebida encosta - do exausto -
1.
Por trás do brilho da pedra - a luz do inexorável -
O alto da montanha - o ilimitado - que a céu aberto se perfilha -
A neve espessa - que assoma na retina - indescritível -
Sobre a nuvem - o musgo - uma cabra - reflectida -
2.
No abismo - de mansinho roçando - eu vi-te - em fuga - junto à lâmpada imóvel -
Pelo desfiladeiro - o azul do aéreo - na despercebida encosta - do exausto -
segunda-feira, 16 de novembro de 2009
DO ALTO AS NAVES
- NO RASTRO DO TÁCITO
1.
Que pedra desliza - do alto cume - ignoro -
O voo da ave - o que desaba - nas nuvens -
Meu chão de lages – as cabras - sobre o incêndio -
2.
O que nos circunscreve às naves - a noite inacessível -
O branco - a cal dos frontispícios - a própria voz furtiva -
No rastro do tácito - ao invisível – o que não cessa -
Porto, 16 nov. 2009
1.
Que pedra desliza - do alto cume - ignoro -
O voo da ave - o que desaba - nas nuvens -
Meu chão de lages – as cabras - sobre o incêndio -
2.
O que nos circunscreve às naves - a noite inacessível -
O branco - a cal dos frontispícios - a própria voz furtiva -
No rastro do tácito - ao invisível – o que não cessa -
Porto, 16 nov. 2009
sexta-feira, 13 de novembro de 2009
ÎLE SAINT-LOUIS
Je me retourne souvent – sur Paris et son île – les yeux – surtout les yeux – la voix – ce feu – Qui nous hante
Je ne sais pas oublier la voix – la respiration – ô flamme – le mal au coeur
Je marche solitaire – en fumant – au dessus de l’eau – la pluie – les jours des jours – j’essais de te retrouver
Je ne sais pas oublier la voix – la respiration – ô flamme – le mal au coeur
Je marche solitaire – en fumant – au dessus de l’eau – la pluie – les jours des jours – j’essais de te retrouver
terça-feira, 10 de novembro de 2009
O FRÉMITO DA PALAVRA OBSTINADA
SOB AS ARCADAS, A CONVULSÃO DO AÉREO
1.
transpondo a voz - de robert browning - a desmedida do incêndio - o que vacila -
na orla da noite - pela intempérie - súbita a clarividência do excesso -
2.
junto ao parapeito da janela- um odor salino - dissolvendo-se - o sono austero - o redobrado alento - da nudez -
o que se furta ao incontido - nos sinais do anónimo - a veemência do pleno -
3.
sob as arcadas - a sobriedade da erva e o premente corpo - a pedra do desvaste -
o relâmpago - onde me precipito - o que se furta ao dizer - na língua do exausto - os gerânios -
4.
o êxtasse - inacessível- animal que invoco - o assíduo olhar - nos confins do longínquo
- a música do inóspito - a convulsão do aéreo - o abutre e a cisterna -
5.
ante a lucidez do inexplícito - o que subsiste pelo ininterrupto - se evola no branco - o que assoma no tremor - pela cegueira do exímio - o frémito da palavra obstinada -
6.
pelo alto da falésia - o que se entrelaça - no vento e na água - as constelações do esquivo -
o azul do céu - interminável - o musgo inconsolável - uma rã sumindo-se -
1.
transpondo a voz - de robert browning - a desmedida do incêndio - o que vacila -
na orla da noite - pela intempérie - súbita a clarividência do excesso -
2.
junto ao parapeito da janela- um odor salino - dissolvendo-se - o sono austero - o redobrado alento - da nudez -
o que se furta ao incontido - nos sinais do anónimo - a veemência do pleno -
3.
sob as arcadas - a sobriedade da erva e o premente corpo - a pedra do desvaste -
o relâmpago - onde me precipito - o que se furta ao dizer - na língua do exausto - os gerânios -
4.
o êxtasse - inacessível- animal que invoco - o assíduo olhar - nos confins do longínquo
- a música do inóspito - a convulsão do aéreo - o abutre e a cisterna -
5.
ante a lucidez do inexplícito - o que subsiste pelo ininterrupto - se evola no branco - o que assoma no tremor - pela cegueira do exímio - o frémito da palavra obstinada -
6.
pelo alto da falésia - o que se entrelaça - no vento e na água - as constelações do esquivo -
o azul do céu - interminável - o musgo inconsolável - uma rã sumindo-se -
O CLARÃO DO ABAT-JOUR
- A VOZ DO SOLÍCITO
a voz do solícito e o corpo do irrepreensível
na noite humedecida o clarão do abat-jour
junto da parede branca a indolência da neve
o sussuro do irreprimível coração e as nuvens
sobre o orvalho a timidez quando a luz desponta
o anjo infinito impassível que resvala no exausto
a voz do solícito e o corpo do irrepreensível
na noite humedecida o clarão do abat-jour
junto da parede branca a indolência da neve
o sussuro do irreprimível coração e as nuvens
sobre o orvalho a timidez quando a luz desponta
o anjo infinito impassível que resvala no exausto
sexta-feira, 6 de novembro de 2009
CAMPO DI FIORI
giordano bruno
1.
junto do céu largo em campo di fiori
vislumbrei a agonia de giordano bruno
o incêndio e a inanição sobre as nuvens
o clamor do hediondo e o instante funesto
2.
há muito apreendi o tremor que o céu cala
silencioso e trémulo permaneço sem alento
um indescritível pavor me ensombra a alma
a prudência reclama a língua da estranheza
3.
como hei-de eu enfrentar a astúcia e a mentira
perdoando aos que exultam a auctoritas divina
lacônicos julgam sobriamente a voz do sagaz
4.
no rasto do que se expande o crime se mantém
o absurdo mata de novo e a arrogância ascende
Porto, 6 Novembro 2009
1.
junto do céu largo em campo di fiori
vislumbrei a agonia de giordano bruno
o incêndio e a inanição sobre as nuvens
o clamor do hediondo e o instante funesto
2.
há muito apreendi o tremor que o céu cala
silencioso e trémulo permaneço sem alento
um indescritível pavor me ensombra a alma
a prudência reclama a língua da estranheza
3.
como hei-de eu enfrentar a astúcia e a mentira
perdoando aos que exultam a auctoritas divina
lacônicos julgam sobriamente a voz do sagaz
4.
no rasto do que se expande o crime se mantém
o absurdo mata de novo e a arrogância ascende
Porto, 6 Novembro 2009
quarta-feira, 4 de novembro de 2009
LINGUAGEM DO SILÊNCIO
entre as túlipas deslizo imperturbado na voz humecida o inflexível corpo
torno-me esquivo emerso na linguagem do silêncio e quiçá da morte
rendido ao arcano maior do tarô as imagens do anónimo escuto schoenberg
sobre a erva me reclino na luz pelo canto matutino o sono denso o rastro do imensurável
adormeço cada noite sobre as marés no branco que enlouquece a pedra incandescente
ante a música do irrecuperável perco-me na boca sequiosa a areia branca e intranquila
visualizo o odor febril e doce no esgar da nudez permeço à tua espera absorto
por sobre o intransferível transporto o fulgor do ininterrupto o alarme das nuvens e isso é tudo
torno-me esquivo emerso na linguagem do silêncio e quiçá da morte
rendido ao arcano maior do tarô as imagens do anónimo escuto schoenberg
sobre a erva me reclino na luz pelo canto matutino o sono denso o rastro do imensurável
adormeço cada noite sobre as marés no branco que enlouquece a pedra incandescente
ante a música do irrecuperável perco-me na boca sequiosa a areia branca e intranquila
visualizo o odor febril e doce no esgar da nudez permeço à tua espera absorto
por sobre o intransferível transporto o fulgor do ininterrupto o alarme das nuvens e isso é tudo
segunda-feira, 2 de novembro de 2009
VOZ HUMEDECIDA
Entre as túlipas deslizo imperturbado na voz humedecida
Torno-me esquivo emerso na treva
Rendido ao arcano maior do tarô
Sobre a erva me reclino o canto matutino
Adormeço no branco a pedra incandescente
A música no esgar da nudez à tua espera absorto
Por sobre o fulgor da luz o alarme das nuvens
Torno-me esquivo emerso na treva
Rendido ao arcano maior do tarô
Sobre a erva me reclino o canto matutino
Adormeço no branco a pedra incandescente
A música no esgar da nudez à tua espera absorto
Por sobre o fulgor da luz o alarme das nuvens
sexta-feira, 30 de outubro de 2009
NUVEM INACESSÍVEL
1.
secreta mente o ouro resplendia
iluminava a voz do imponderável
2.
No rastro do branco a cor assoma
O que se dissipa no pulsar da treva
3.
Apreendemos a desmedida do incêndio
Pelo mais recôndita cegueira o explícito
4.
Saberemos fixar o meticuloso o inexcedido
O que se furta à eloquência do despropósito
5.
A luz nuvem inacessível se mantém o premente
6.
Sobre o inexorável o fulgor do corpo e a deriva
A desmesura dos sinais e a distância inigualável
secreta mente o ouro resplendia
iluminava a voz do imponderável
2.
No rastro do branco a cor assoma
O que se dissipa no pulsar da treva
3.
Apreendemos a desmedida do incêndio
Pelo mais recôndita cegueira o explícito
4.
Saberemos fixar o meticuloso o inexcedido
O que se furta à eloquência do despropósito
5.
A luz nuvem inacessível se mantém o premente
6.
Sobre o inexorável o fulgor do corpo e a deriva
A desmesura dos sinais e a distância inigualável
quinta-feira, 29 de outubro de 2009
GEOMETRIA DO ANOMALOM
Esparso
1.
Sob o pórtico iluminado
Fixas o êxtase da pintura
A justeza do abrupto
O branco que deflagra
Na sucinta pedra
A insensatez
2.
Nessas paredes mestras
Retomas o esparso
A cegueira do visível
3.
Sob essa luz
O propício corpo
A geometria
Do anomalom
O que desaba
1.
Sob o pórtico iluminado
Fixas o êxtase da pintura
A justeza do abrupto
O branco que deflagra
Na sucinta pedra
A insensatez
2.
Nessas paredes mestras
Retomas o esparso
A cegueira do visível
3.
Sob essa luz
O propício corpo
A geometria
Do anomalom
O que desaba
sábado, 24 de outubro de 2009
Incendie Lointain
La poursuite vertigineuse de l’émotion – la spendeur de la pénombre et la lumière – donc – tu marches dans mes rêves.
Je ne sais pas s’il est vraiment le jour – il y a que la transparence de la flamme – ta lumière – c’est au soleil que nous tendons –
Sans dire un mot – murmurant – au dessus des yeux - eclosion de la nuit – en flottant – parlerais-je une langue – audible- d’enchantement ?
Laisses tomber la pluie – autour du feu – m’entrelacer dans ton corp – sans dire un mot –
Jusqu’au transe – en me laissant tomber – par mes yeux dans les tiens – alors que me suis remis au lit
J’ai vu la passion – son image – belle – endormie – au coeur de la nuit – Qui me traverse l’esprit – incantatoire
Immenses zenith de la langue – hauteur poetique – si fragile – passion
Longue fut cette nuit – euphorie solitude ivresse – une voix m’est venue en rêve – ton signe – des beaux incendies.
Je n’avais – comme tu savais – qu’un chat noir- moi – soudain insatisfais – et qu’une maison – ma chambre ou j’allumais une cigarette – angoisse – des tableaux de charbon- masques superbes – et tes yeux
Donnes-moi une belle couleur – ce que l’on nomme d’eau – le mot visible – dans le delire consume
Au seuil du sommeil – poursuits ta demande – sur le chemin de l’amour – que tu illumines
Longtemps - touchant le vide du ciel – je ne sais plus – au-dessus d’un rêve – quand tu reviendras
Il n’y a plus que le voyage – l’âme inexprimable – je tremble encore une fois jusqu’a perdre la raison
Sommeil inattendu – reve – manifestation – tu – visage excessive – eclats de la voix – transpiration – d’attente.
Je t’ai vu – au plus profond – le demi sommeil – sous la musique –insaisissable
Courtes, Porto 2009
Je ne sais pas s’il est vraiment le jour – il y a que la transparence de la flamme – ta lumière – c’est au soleil que nous tendons –
Sans dire un mot – murmurant – au dessus des yeux - eclosion de la nuit – en flottant – parlerais-je une langue – audible- d’enchantement ?
Laisses tomber la pluie – autour du feu – m’entrelacer dans ton corp – sans dire un mot –
Jusqu’au transe – en me laissant tomber – par mes yeux dans les tiens – alors que me suis remis au lit
J’ai vu la passion – son image – belle – endormie – au coeur de la nuit – Qui me traverse l’esprit – incantatoire
Immenses zenith de la langue – hauteur poetique – si fragile – passion
Longue fut cette nuit – euphorie solitude ivresse – une voix m’est venue en rêve – ton signe – des beaux incendies.
Je n’avais – comme tu savais – qu’un chat noir- moi – soudain insatisfais – et qu’une maison – ma chambre ou j’allumais une cigarette – angoisse – des tableaux de charbon- masques superbes – et tes yeux
Donnes-moi une belle couleur – ce que l’on nomme d’eau – le mot visible – dans le delire consume
Au seuil du sommeil – poursuits ta demande – sur le chemin de l’amour – que tu illumines
Longtemps - touchant le vide du ciel – je ne sais plus – au-dessus d’un rêve – quand tu reviendras
Il n’y a plus que le voyage – l’âme inexprimable – je tremble encore une fois jusqu’a perdre la raison
Sommeil inattendu – reve – manifestation – tu – visage excessive – eclats de la voix – transpiration – d’attente.
Je t’ai vu – au plus profond – le demi sommeil – sous la musique –insaisissable
Courtes, Porto 2009
sexta-feira, 23 de outubro de 2009
CLÂMIDE DE PÚRPURA
Ante o corpo devastado indaguei a noite
Sobre as grandes catedrais
Apaziguei a dor
À procura dos sinais funestos
Retomei o que enlouquece
Do céu desceu um clâmide de púrpura
A pedra perene da levitação
A voz do anjo
Se esvai perpassada de ecos
Sombras e dilúvios
Sobre as grandes catedrais
Apaziguei a dor
À procura dos sinais funestos
Retomei o que enlouquece
Do céu desceu um clâmide de púrpura
A pedra perene da levitação
A voz do anjo
Se esvai perpassada de ecos
Sombras e dilúvios
quarta-feira, 21 de outubro de 2009
O INOLVIDÁVEL
Volúpia do cisne
Perpetuas a volúpia do cisne
Sobre os plátanos a lucidez
Do corpo quando te despes
Nuvens do obstinado
Que corpo fugaz se insinua
Nas nuvens do obstinado
Inebriado me arrebata
Ancas e ombros toda a temeridade
Voz da loucura
Dir-te-ei a voz da loucura
O corpo do inominável
A nudez do sumptuoso
Na penumbra dos sinais
Sussuro da voz
O que apazigua o incêndio
Na palavra escrita
O sussuro da voz
Alucinada
Umbral
De umbral em umbral – a erva nocturna – o inolvidável
O terrestre
Ignoras a apoteose do que resplandece
no tumulto - junto ao que ecoa - o terrestre
o tigre e o branco que nos sustém
- a pedra da loucura - onde a lucidez se perde
Sagesse
Sobreveio por completo a sagesse
A perspicácia das metáforas
Em meus versos exasperados
Réstia do branco
Escura e turva nuvem que me cobre
A nave o âmago da pedra sobre nada
A réstia do branco e o orvalho furtivo
A mão que acena sobre o que incendeia
Porto, 21 de Outubro 2009
Perpetuas a volúpia do cisne
Sobre os plátanos a lucidez
Do corpo quando te despes
Nuvens do obstinado
Que corpo fugaz se insinua
Nas nuvens do obstinado
Inebriado me arrebata
Ancas e ombros toda a temeridade
Voz da loucura
Dir-te-ei a voz da loucura
O corpo do inominável
A nudez do sumptuoso
Na penumbra dos sinais
Sussuro da voz
O que apazigua o incêndio
Na palavra escrita
O sussuro da voz
Alucinada
Umbral
De umbral em umbral – a erva nocturna – o inolvidável
O terrestre
Ignoras a apoteose do que resplandece
no tumulto - junto ao que ecoa - o terrestre
o tigre e o branco que nos sustém
- a pedra da loucura - onde a lucidez se perde
Sagesse
Sobreveio por completo a sagesse
A perspicácia das metáforas
Em meus versos exasperados
Réstia do branco
Escura e turva nuvem que me cobre
A nave o âmago da pedra sobre nada
A réstia do branco e o orvalho furtivo
A mão que acena sobre o que incendeia
Porto, 21 de Outubro 2009
sábado, 17 de outubro de 2009
INCOMENSURÁVEL
irrompendo pelo incomensurável
o recato falou
furtiva a chama imóvel
por entre as papoilas
na desmedida do branco
a nuvem no escuro de seu quarto
o secreto lampejo da luz
sobre o dia nublado
o recato falou
furtiva a chama imóvel
por entre as papoilas
na desmedida do branco
a nuvem no escuro de seu quarto
o secreto lampejo da luz
sobre o dia nublado
Sens
Je contemple ses yeux avides – Qui me demandent mon secret qui t’appartient – halo d’or – insondable?
Que mes yeux vont plus loin – éclatant proximité de l’invisible – tu deviens secret – transmutes ma fureur
Révèles-toi – tu te rencontreras – dedans – subconsciemment
L’écho débordant – des heures insatisfaites – rêve – d’une nymphe qui dormait dans le fond de la mer
Dans cette torpeur j’attends – le murmure magique – sa voix – à travers mes rêves
Laisse m’enivrer du simple éclat – des yeux – le cœur veut s’illuminer – cette nuit
Je restais sans voix – consumée dans l’infini – puisses-vous ouvrir mes yeux d’adolescent – je demeure des nuits a t’espérer
Ta voix – jadis – troublait mon sang – avec des tentations aventureuses
J’aime ce qui en toi me métamorphose
Que mes yeux vont plus loin – éclatant proximité de l’invisible – tu deviens secret – transmutes ma fureur
Révèles-toi – tu te rencontreras – dedans – subconsciemment
L’écho débordant – des heures insatisfaites – rêve – d’une nymphe qui dormait dans le fond de la mer
Dans cette torpeur j’attends – le murmure magique – sa voix – à travers mes rêves
Laisse m’enivrer du simple éclat – des yeux – le cœur veut s’illuminer – cette nuit
Je restais sans voix – consumée dans l’infini – puisses-vous ouvrir mes yeux d’adolescent – je demeure des nuits a t’espérer
Ta voix – jadis – troublait mon sang – avec des tentations aventureuses
J’aime ce qui en toi me métamorphose
sexta-feira, 16 de outubro de 2009
O IRREMEDIÁVEL
DACHAU
- do anjo - da história - pesa a fremente dor – a impossível - morada - exilados - na terra – somos fantasmas esparsos - céu afora – em dachau - tudo se torna grotesco e lasso – nenhum milagre – deus – prestação do futuro - sobre os baixios – da desolação – a nudez pressentida - o gás -
no sussuro - da morte - eu fui o primeiro a entrar - obediente à chamada - dos algozes - irreconhecido - recordo apenas as lições da desdita - o irremediável - a neve responder-me-á ?-
- do anjo - da história - pesa a fremente dor – a impossível - morada - exilados - na terra – somos fantasmas esparsos - céu afora – em dachau - tudo se torna grotesco e lasso – nenhum milagre – deus – prestação do futuro - sobre os baixios – da desolação – a nudez pressentida - o gás -
no sussuro - da morte - eu fui o primeiro a entrar - obediente à chamada - dos algozes - irreconhecido - recordo apenas as lições da desdita - o irremediável - a neve responder-me-á ?-
quinta-feira, 15 de outubro de 2009
A BELEZA DO ARCANO
LUZ SONOLENTA
Não me escrevas! Deslumbra!
Sou espanto desnudo do caminho
O rumor de um largo escrito na orla da noite
Sou o prado e a cabra luminosa o que sussurra
Sou o canto indizível num espectro de pedra
Uma luz sonolenta e o orvalho inconsistente
A neve e a erva dócil junto da cisterna
Sou a abóbada e a nave do incêndio
Sob a voz obscura que finda
BOSQUE ERMO
Por sobre o bosque ermo
O relâmpago
Sob os carvalhos
Apenas vejo o vago e o fugaz
Quando o incêndio espreita
TAROT
Torno-me esquivo no alento da pedra
Rendido ao arcano maior do tarot
Sobre a erva me reclino à tua espera
Absorto por sobre o fulgor da lâmpada
Na voz humecida a luz do ininterrupto
INFLAMMATUS ET ACCENSUS
1.
- sem que saiba a beleza do arcano - a insensatez dos versos - a língua do exausto - a minúcia da escrita - o simulacrum - o que se furta ao interminável -
2.
- a voz do anónimo - nessas éclogas - a penumbra do excesso - a minúcia do que tarda - o irrepresentável –
3.
- nesse limite do corpo - o penoso - a exuberantia do incontido - o premente - o inapropriável –
4.
- sou afrodite, corpo enigma, mar de cobalto – o parco e o inexcedido – o léxico e a carência – a clarividência do excesso –
5.
- a demência do láudano - o prévio – o indeterminatum – inflammatus et accensus -
VOZ MUDA DO ARDOR
- sobre o ímpeto alucinado seu corpo exangue - a voz muda do ardor - o incomensurável – a erva muda - donde provenho - a justeza do abrupto – o deserto - o fulgor do irredutível -
Porto, 15 Outubro 2009
Não me escrevas! Deslumbra!
Sou espanto desnudo do caminho
O rumor de um largo escrito na orla da noite
Sou o prado e a cabra luminosa o que sussurra
Sou o canto indizível num espectro de pedra
Uma luz sonolenta e o orvalho inconsistente
A neve e a erva dócil junto da cisterna
Sou a abóbada e a nave do incêndio
Sob a voz obscura que finda
BOSQUE ERMO
Por sobre o bosque ermo
O relâmpago
Sob os carvalhos
Apenas vejo o vago e o fugaz
Quando o incêndio espreita
TAROT
Torno-me esquivo no alento da pedra
Rendido ao arcano maior do tarot
Sobre a erva me reclino à tua espera
Absorto por sobre o fulgor da lâmpada
Na voz humecida a luz do ininterrupto
INFLAMMATUS ET ACCENSUS
1.
- sem que saiba a beleza do arcano - a insensatez dos versos - a língua do exausto - a minúcia da escrita - o simulacrum - o que se furta ao interminável -
2.
- a voz do anónimo - nessas éclogas - a penumbra do excesso - a minúcia do que tarda - o irrepresentável –
3.
- nesse limite do corpo - o penoso - a exuberantia do incontido - o premente - o inapropriável –
4.
- sou afrodite, corpo enigma, mar de cobalto – o parco e o inexcedido – o léxico e a carência – a clarividência do excesso –
5.
- a demência do láudano - o prévio – o indeterminatum – inflammatus et accensus -
VOZ MUDA DO ARDOR
- sobre o ímpeto alucinado seu corpo exangue - a voz muda do ardor - o incomensurável – a erva muda - donde provenho - a justeza do abrupto – o deserto - o fulgor do irredutível -
Porto, 15 Outubro 2009
quarta-feira, 14 de outubro de 2009
NO RASTO DA LUZ PRATEADA
Falésia
- entre as tendas da praia - junto à falésia - no rasto da luz prateada – recorro à memória. Que se me evoca o pátio: a árvore do júbilo. Vêem-me à tona as imagens da porta entre-aberta. Ante o atelier de cézane - vislumbrei os quadros - o chão de lages escurecido – e as tuas pálpebras escurecidas. Anos mais tarde regressei à velha torre - de pedra e cal. E ao longo da duna – vi o acaso rubro sobre o mar verde e os relâmpagos reflectidos. Da próxima vez, demorar-me-ei. Dir-te-ei a cláusula celeste. O que se repercute na voz em meio às naves.
Sereia
-lembro um diagrama antigo - a melancolia mesopotâmica - um resto de nogueira de altenburgo - um cacto na minha parede do sexto andar – o retrato do jovem ésquilo ali mesmo – sob a ponte de brooklim – a amplitude do deserto - sempre recomeçado - a terra extenuada que me prende – voz inimitável – da sereia – que me impele à doce ciência de que vivo - o cemitério marinho – sobre o ouro e a pedra – inflexível -
Ambrósia
1.
- como tirésias - a toda a hora me confunde a cegueira - instantâneo visionador - guardo as imagens do inexcedível - a ambrósia dos deuses – o azul e a pedra - o que transbordou da inépcia – a espuma do nada e a voz do incêndio –
2.
- o que vacila na luz – sobre o empedrado – minha vereda – precipício mudo -
3.
- sob as nuvens convulsas - esse corpo da insónia - na tela colada ao céu indefinidamente –
4.
- o azul das ondas - por sobre as estrelas - o que se repercute no silêncio dos icebergs - a baleia branca de herman melville -
.
Estrada azul
- quem se aparta desnudo , passo ledo, pela estrada azul, da luz volúvel se nutre? cego expulso dos dias futuros na inacção renuncia? A deus, o seu poder oculto - ?
Presença porosa
Tudo retorna ao impreciso, a douta ignorância, sobre a luz inobjectiva. Num relance torno-me díspar. Descortino a forma, o ocre. A presença porosa. O insensato delírio da pintura. Onde me encontro, lá estás. Procuro saber que voz resgata o meu passado. Minha cegueira, solidão, não mais pode ser mantida.
- entre as tendas da praia - junto à falésia - no rasto da luz prateada – recorro à memória. Que se me evoca o pátio: a árvore do júbilo. Vêem-me à tona as imagens da porta entre-aberta. Ante o atelier de cézane - vislumbrei os quadros - o chão de lages escurecido – e as tuas pálpebras escurecidas. Anos mais tarde regressei à velha torre - de pedra e cal. E ao longo da duna – vi o acaso rubro sobre o mar verde e os relâmpagos reflectidos. Da próxima vez, demorar-me-ei. Dir-te-ei a cláusula celeste. O que se repercute na voz em meio às naves.
Sereia
-lembro um diagrama antigo - a melancolia mesopotâmica - um resto de nogueira de altenburgo - um cacto na minha parede do sexto andar – o retrato do jovem ésquilo ali mesmo – sob a ponte de brooklim – a amplitude do deserto - sempre recomeçado - a terra extenuada que me prende – voz inimitável – da sereia – que me impele à doce ciência de que vivo - o cemitério marinho – sobre o ouro e a pedra – inflexível -
Ambrósia
1.
- como tirésias - a toda a hora me confunde a cegueira - instantâneo visionador - guardo as imagens do inexcedível - a ambrósia dos deuses – o azul e a pedra - o que transbordou da inépcia – a espuma do nada e a voz do incêndio –
2.
- o que vacila na luz – sobre o empedrado – minha vereda – precipício mudo -
3.
- sob as nuvens convulsas - esse corpo da insónia - na tela colada ao céu indefinidamente –
4.
- o azul das ondas - por sobre as estrelas - o que se repercute no silêncio dos icebergs - a baleia branca de herman melville -
.
Estrada azul
- quem se aparta desnudo , passo ledo, pela estrada azul, da luz volúvel se nutre? cego expulso dos dias futuros na inacção renuncia? A deus, o seu poder oculto - ?
Presença porosa
Tudo retorna ao impreciso, a douta ignorância, sobre a luz inobjectiva. Num relance torno-me díspar. Descortino a forma, o ocre. A presença porosa. O insensato delírio da pintura. Onde me encontro, lá estás. Procuro saber que voz resgata o meu passado. Minha cegueira, solidão, não mais pode ser mantida.
INEXORÁVEL MUSA
torpor do desvario
- por entre a tela branca - na lucidez que se esvai -que grito assoma
traço se desvanece ? - quem se furta à inexorável musa - no torpor do desvario – irrompe pela luz - o inexplícito? -
sinais
- nesses lábios mudos - a sua face evanescente - a opacidade dos sinais -
- por entre a tela branca - na lucidez que se esvai -que grito assoma
traço se desvanece ? - quem se furta à inexorável musa - no torpor do desvario – irrompe pela luz - o inexplícito? -
sinais
- nesses lábios mudos - a sua face evanescente - a opacidade dos sinais -
terça-feira, 13 de outubro de 2009
UMA ENCENADORA DE SI MESMO: DEBORAH NOFRET
Bricolage(s)
Depois de em 2006 ter exposto as suas obras em Lisboa, sob o título de Arritmias, Deborah Nofret leva agora ao Porto "Preferências Prestadas". Esta mostra pode, muito propriamente, ser considerada o resultado de vário decênios de experimentação e que consiste, por sua vez, em uma espécie de (re)consideração das tecnologias digitais (onde perpassa um modelo, muito abrangente, de arte como “constructo”). Estamos fora do alcance instância da(s) autorferência(s) identificatória(s) e da auto-representação - a chamada matriz narcísica-desconstrucionista, de um eu fracionado ou pulverizado, virtualmente invisível - , que, por si mesmo, pode ser tomada como ponto revelador da sua arte. Estamos assim no limite de uma ambivalência original que, contando prática e exclusivamente com os recursos das artes mais ou menos áureas, - o “suporte” fotográfico e/ou pictórico – guarda uma nuance de poeticidade. É isso que constitui a sua autenticidade.
Speculum
Sucede, por vezes, que os criadores – e eu aqui só me refiro, já se vê, às suas “démarches” aparentemente dispersas - , ganham consciência das suas obsessões – as feridas do simbólico, mais que feridas simbólicas –, e da unidade dos seus temas – aleatória e ecleticamente, fragmentando a coesão e a continuidade tão queridas da arte elevada -, surpreendidos por se verem tão iguais no diferente. Podemos hoje falar da obra arte (a escrita contemporânea) enquanto cifra, revelação, speculum, bricolage? Enquanto corolário do que é manifestus - algo que o homem produz com sentido expresso – e, em última análise, excessus?
Beleza?
Existe, pois dissemo-lo, um modo de ser específico: a obra de arte, onde se patenteia a beleza de um tempo não-reconciliado? Como avaliar o (des) acerto, a (in) consistência, a rasura, o resíduo in/decifrável das configurações criadoras, das diferentes versões da arte, os seus traços intempestivos e o seu rastro (e)scritural ? Algumas vezes mesmo, torna-se difícil avaliar os limites que separam os planos ou “níveis” da arte, tanto mais, que a par da identidade reencontrada, é preciso ter em conta a multiplicidade aberta numa obra. Será que a afirmação de Max Bense em “Aesthetica” de que a beleza é, pois, aquilo no qual a obra de arte supera, transcende, a realidade, é verdadeira? Contra este ponto de vista pode, todavia, objectar-se o que se segue: ainda que se dê relevo à noção, por motivos óbvios, de produção e percepção da beleza, não se deve deixar de reconhecer, como quer Marc Jimenez, que a arte contemporânea nasce efectivamente sobre um terreno preparado de longa data pela desagregação de sistemas de referência, tais como a imitação, a fidelidade à natureza, a ideia de beleza, harmonia, etc., e pela dissolução dos critérios clássicos (La querelle de l`art contemporain, Paris, 2005).
Resist/diver/(g)ência
“É o prefixo pós, dizia U. Bech, a palavra-chave do nosso tempo”. Tudo é pós”. Mas até nesta visão extrema persiste ainda algo performativo que proclamamos, pois o criador como ser da resistência ou, mais exactamente, da divergência, rompe habitualmente com os interditos e, dentro da arte, tudo é permitido. Talvez não tenhamos sempre o sentimento vivo que nos permita a formação de novas maneiras de significar. É certo que, de alguma maneira, ao nível das práticas artísticas, nos encerramos numa amálgama de tradições diferentes (e muitas vezes inconsistentes entre si) que beiram a incompatibilidade. Nada tem de estranho que, num mundo “tecnopolita”, reine a mais ampla tolerância em relação a todas as formas de arte e todos os estilos sem distinção, que entram – como Jean Braudillard chegou a dizer - no campo estético da simulação.
Do (im)previsto
Viver com a própria repetição é aceitá-la, mas é também tê-la em consideração. De resto e a despeito das aparências contrárias, as repetições na arte e na escrita não são nunca estéreis. O trabalho criador – onde ser é habitualmente fazer – expõe-se a mil encontros dos quais a maior parte são (im)previstos. Temos de prepara-nos para o (im)previsto. Dá-se o caso que tudo é virtual, no sentido em que hoje se emprega este termo, porque habitamos, concretamente, um universo inteiramente formado por imagens. O mundo virtual é, para usar a terminologia de Gilles Deleuze, um universo de efectividade-imagem. Porque é nisso que é preciso insistir: a tecnologia tomou a dianteira. Será que a tecno-ciência está preparando aquela catástrofe do humano que Heidegger chamou a atenção (seguido de perto por Jacques Ellul, Baudillard e Virillio)? É sabido até que o monstruoso criado pelo homem tornou-se manifesto: o monstruoso no espaço criado pelo homem, como monstruoso o tempo criado pelo homem e ainda como o monstruoso nas coisas criadas pelo homem. “A lei da modernidade, sobre este ângulo é, segundo Peter Sloderdijk, o crescente “engagement” de artificialidade em todas as dimensões essenciais da existência” (L’Heure du cime et le temps de l’oueuvre d’art, Calmann-Lévy, Paris, 2000, p. 29)
Hibridações
Pode dizer-se, de maneira geral, que assistimos à (est)ética da) desaparição das fronteiras entre as artes. A adopção do cruzamento e das hibridações das práticas e os materiais - sob todas as formas, como na sua diversidade e antagonismo, - aparecem, no fundo, como recorrentes. Será que os criadores se tornam coagidos, por fidelidade ao sentido que buscam a procurar o vasto domínio das inovações, experimentações, das correspondências inéditas e das polivalências - na demanda de um nova (in)coerência? Deve, pois, examinar-se o caso das referências ao passado, citações, imitações, miscelânea de estilos e o ecletismo. Damos por suposto, claro está, que nem sempre o frenesi do novum e a chamada fé na possibilidade da arte rompem com os cânones académicos e os valores artísticos tradicionais.
Internautas e náufragos
De que modo reconfigurar e redefinir o novum (tomando por base o já constituído a que se reporta)? Poderemos aludir ao terreno de um “eu saturado” de “fracturas” e de “malogros”? Na verificabilidade ou confirmabilidade de uma paisagem repleta de internautas e de náufragos? Se existe um assunto ex(im)plosivo é o das relações entre a tecnologia e a arte, Deborah Nofret documenta essa preoupação, muito expressivamente, em sua obra. O seu carácter inusitado tem o mérito de chamar a atenção para os avatares tecno-digitais propícios a criações inéditas. Vem de longe este seu “engagement” - na via da emergente cultural digital - com o grande organismo que circula nos vasos comunicantes das redes. Ela parece mostrar-nos que a arte não é mais uma questão de definição mas de realização. O seu fazer poiético intervém aqui apenas como inverso do cliché fotográfico (quadrícula) ou da pintura a óleo (tela); intervém por detrás da multimédia, a sociedade-rede, a troca informática, a promessa virtual (de uma espessura de sentido em novos registros).
“Montages-cut”
Dissociando-se, no plano criativo, da encenação de si mesma – a encenação da verdade – que é o próprio acto de sair de si própria, Debora Nofret retoma, ainda que com outra densidade, a criatividade originada da pesquisa (tomando a lógica ou a resposta-meditativa de uma “deriva”). É necessário determo-nos sobre a base experimental e interactiva dos seus quadros (sequências-narrativas)? Todos os entrelaçamentos e as conexões que caracterizam a sua obra remetem-nos para imagens sintéticas ou sínteses de imagens. Nas suas peças - montages-cut” ou bricolage(s)- alcançamos familiaridade com um trajecto de arte que corre o risco de desaparecer por detrás da multimédia. De referir que o conceito de bricolage de Lévi-Strauss foi retomado por Jacques Derrida, em “A estrutura, o signo e o jogo no discurso das ciências humanas”, mas para esboroar a dicotomia entre o bricoleur como improvisador e o engenheiro como o que patrocina um tipo de conhecimento que privilegia a sistematização e o método. Todo o discurso, traduzindo em termos simples e acessíveis, na linguagem derridiana, é bricoleur” e “o próprio engenheiro ou sábio são também espécies de bricoleur”. Cf. Derrida, Jacques. A escritura e a diferença, p. 238-239.
Porto, 29 de Setembro 2007
Depois de em 2006 ter exposto as suas obras em Lisboa, sob o título de Arritmias, Deborah Nofret leva agora ao Porto "Preferências Prestadas". Esta mostra pode, muito propriamente, ser considerada o resultado de vário decênios de experimentação e que consiste, por sua vez, em uma espécie de (re)consideração das tecnologias digitais (onde perpassa um modelo, muito abrangente, de arte como “constructo”). Estamos fora do alcance instância da(s) autorferência(s) identificatória(s) e da auto-representação - a chamada matriz narcísica-desconstrucionista, de um eu fracionado ou pulverizado, virtualmente invisível - , que, por si mesmo, pode ser tomada como ponto revelador da sua arte. Estamos assim no limite de uma ambivalência original que, contando prática e exclusivamente com os recursos das artes mais ou menos áureas, - o “suporte” fotográfico e/ou pictórico – guarda uma nuance de poeticidade. É isso que constitui a sua autenticidade.
Speculum
Sucede, por vezes, que os criadores – e eu aqui só me refiro, já se vê, às suas “démarches” aparentemente dispersas - , ganham consciência das suas obsessões – as feridas do simbólico, mais que feridas simbólicas –, e da unidade dos seus temas – aleatória e ecleticamente, fragmentando a coesão e a continuidade tão queridas da arte elevada -, surpreendidos por se verem tão iguais no diferente. Podemos hoje falar da obra arte (a escrita contemporânea) enquanto cifra, revelação, speculum, bricolage? Enquanto corolário do que é manifestus - algo que o homem produz com sentido expresso – e, em última análise, excessus?
Beleza?
Existe, pois dissemo-lo, um modo de ser específico: a obra de arte, onde se patenteia a beleza de um tempo não-reconciliado? Como avaliar o (des) acerto, a (in) consistência, a rasura, o resíduo in/decifrável das configurações criadoras, das diferentes versões da arte, os seus traços intempestivos e o seu rastro (e)scritural ? Algumas vezes mesmo, torna-se difícil avaliar os limites que separam os planos ou “níveis” da arte, tanto mais, que a par da identidade reencontrada, é preciso ter em conta a multiplicidade aberta numa obra. Será que a afirmação de Max Bense em “Aesthetica” de que a beleza é, pois, aquilo no qual a obra de arte supera, transcende, a realidade, é verdadeira? Contra este ponto de vista pode, todavia, objectar-se o que se segue: ainda que se dê relevo à noção, por motivos óbvios, de produção e percepção da beleza, não se deve deixar de reconhecer, como quer Marc Jimenez, que a arte contemporânea nasce efectivamente sobre um terreno preparado de longa data pela desagregação de sistemas de referência, tais como a imitação, a fidelidade à natureza, a ideia de beleza, harmonia, etc., e pela dissolução dos critérios clássicos (La querelle de l`art contemporain, Paris, 2005).
Resist/diver/(g)ência
“É o prefixo pós, dizia U. Bech, a palavra-chave do nosso tempo”. Tudo é pós”. Mas até nesta visão extrema persiste ainda algo performativo que proclamamos, pois o criador como ser da resistência ou, mais exactamente, da divergência, rompe habitualmente com os interditos e, dentro da arte, tudo é permitido. Talvez não tenhamos sempre o sentimento vivo que nos permita a formação de novas maneiras de significar. É certo que, de alguma maneira, ao nível das práticas artísticas, nos encerramos numa amálgama de tradições diferentes (e muitas vezes inconsistentes entre si) que beiram a incompatibilidade. Nada tem de estranho que, num mundo “tecnopolita”, reine a mais ampla tolerância em relação a todas as formas de arte e todos os estilos sem distinção, que entram – como Jean Braudillard chegou a dizer - no campo estético da simulação.
Do (im)previsto
Viver com a própria repetição é aceitá-la, mas é também tê-la em consideração. De resto e a despeito das aparências contrárias, as repetições na arte e na escrita não são nunca estéreis. O trabalho criador – onde ser é habitualmente fazer – expõe-se a mil encontros dos quais a maior parte são (im)previstos. Temos de prepara-nos para o (im)previsto. Dá-se o caso que tudo é virtual, no sentido em que hoje se emprega este termo, porque habitamos, concretamente, um universo inteiramente formado por imagens. O mundo virtual é, para usar a terminologia de Gilles Deleuze, um universo de efectividade-imagem. Porque é nisso que é preciso insistir: a tecnologia tomou a dianteira. Será que a tecno-ciência está preparando aquela catástrofe do humano que Heidegger chamou a atenção (seguido de perto por Jacques Ellul, Baudillard e Virillio)? É sabido até que o monstruoso criado pelo homem tornou-se manifesto: o monstruoso no espaço criado pelo homem, como monstruoso o tempo criado pelo homem e ainda como o monstruoso nas coisas criadas pelo homem. “A lei da modernidade, sobre este ângulo é, segundo Peter Sloderdijk, o crescente “engagement” de artificialidade em todas as dimensões essenciais da existência” (L’Heure du cime et le temps de l’oueuvre d’art, Calmann-Lévy, Paris, 2000, p. 29)
Hibridações
Pode dizer-se, de maneira geral, que assistimos à (est)ética da) desaparição das fronteiras entre as artes. A adopção do cruzamento e das hibridações das práticas e os materiais - sob todas as formas, como na sua diversidade e antagonismo, - aparecem, no fundo, como recorrentes. Será que os criadores se tornam coagidos, por fidelidade ao sentido que buscam a procurar o vasto domínio das inovações, experimentações, das correspondências inéditas e das polivalências - na demanda de um nova (in)coerência? Deve, pois, examinar-se o caso das referências ao passado, citações, imitações, miscelânea de estilos e o ecletismo. Damos por suposto, claro está, que nem sempre o frenesi do novum e a chamada fé na possibilidade da arte rompem com os cânones académicos e os valores artísticos tradicionais.
Internautas e náufragos
De que modo reconfigurar e redefinir o novum (tomando por base o já constituído a que se reporta)? Poderemos aludir ao terreno de um “eu saturado” de “fracturas” e de “malogros”? Na verificabilidade ou confirmabilidade de uma paisagem repleta de internautas e de náufragos? Se existe um assunto ex(im)plosivo é o das relações entre a tecnologia e a arte, Deborah Nofret documenta essa preoupação, muito expressivamente, em sua obra. O seu carácter inusitado tem o mérito de chamar a atenção para os avatares tecno-digitais propícios a criações inéditas. Vem de longe este seu “engagement” - na via da emergente cultural digital - com o grande organismo que circula nos vasos comunicantes das redes. Ela parece mostrar-nos que a arte não é mais uma questão de definição mas de realização. O seu fazer poiético intervém aqui apenas como inverso do cliché fotográfico (quadrícula) ou da pintura a óleo (tela); intervém por detrás da multimédia, a sociedade-rede, a troca informática, a promessa virtual (de uma espessura de sentido em novos registros).
“Montages-cut”
Dissociando-se, no plano criativo, da encenação de si mesma – a encenação da verdade – que é o próprio acto de sair de si própria, Debora Nofret retoma, ainda que com outra densidade, a criatividade originada da pesquisa (tomando a lógica ou a resposta-meditativa de uma “deriva”). É necessário determo-nos sobre a base experimental e interactiva dos seus quadros (sequências-narrativas)? Todos os entrelaçamentos e as conexões que caracterizam a sua obra remetem-nos para imagens sintéticas ou sínteses de imagens. Nas suas peças - montages-cut” ou bricolage(s)- alcançamos familiaridade com um trajecto de arte que corre o risco de desaparecer por detrás da multimédia. De referir que o conceito de bricolage de Lévi-Strauss foi retomado por Jacques Derrida, em “A estrutura, o signo e o jogo no discurso das ciências humanas”, mas para esboroar a dicotomia entre o bricoleur como improvisador e o engenheiro como o que patrocina um tipo de conhecimento que privilegia a sistematização e o método. Todo o discurso, traduzindo em termos simples e acessíveis, na linguagem derridiana, é bricoleur” e “o próprio engenheiro ou sábio são também espécies de bricoleur”. Cf. Derrida, Jacques. A escritura e a diferença, p. 238-239.
Porto, 29 de Setembro 2007
domingo, 11 de outubro de 2009
A FACE DO VISÍVEL
quem se aparta
pelo céu escurecido sob as primeiras estrelas
incendeia à saciedade
a face do visível
permanece sob os carvalhos
pela música do inenarrável
quem após longas vigílias
busca o emerso corpo
a face morena empalecida
o sussuro da voz incandescente
quem no encalço da essência artística da arte fixa o delírio
seduzido pelas sereias se regozija com os gerânios
sexta-feira, 9 de outubro de 2009
O IMPLÍCITO
Naves
O que nos circunscreve às naves
O branco - a cal dos frontispícios -
No rastro do tácito - ao invisível -
Irresoluto
Quem emerso no irresoluto – se expõe -
Faz brotar a luz - a voz do prolixo -
Na constância da pedra fixa o explícito
Junto ao que se dissipa - de divina propotione -
O que nos circunscreve às naves
O branco - a cal dos frontispícios -
No rastro do tácito - ao invisível -
Irresoluto
Quem emerso no irresoluto – se expõe -
Faz brotar a luz - a voz do prolixo -
Na constância da pedra fixa o explícito
Junto ao que se dissipa - de divina propotione -
AS TÚLIPAS
Inapreensível
- quem ilumina a lucidez do obscuro – o inerte - na demência das palavras - o incólume – o que se refracta - permanece junto do inapreensível - a quietude - sob as abóbadas e as túlipas – em segredo - retoma a imagem baça - junto da vidraça – o corpo do aéreo - mudo - a luz que incide sobre as costas nuas - a voz do intocado -
Ante-manhã
O ímpeto da claridade seduz - faz jorrar a voz do intangível - sob o jugo das túlipas - a boca - interminável - compassiva - através das cortinas - o esguio - corpo – e essa lucidez do aéreo - que omoplata silenciosa - mão escassa - se me abre – protectora - súbito o deserto - ante-manhã - a música do resguardo ?-
Porto, 9 de Outubro de 2009
- quem ilumina a lucidez do obscuro – o inerte - na demência das palavras - o incólume – o que se refracta - permanece junto do inapreensível - a quietude - sob as abóbadas e as túlipas – em segredo - retoma a imagem baça - junto da vidraça – o corpo do aéreo - mudo - a luz que incide sobre as costas nuas - a voz do intocado -
Ante-manhã
O ímpeto da claridade seduz - faz jorrar a voz do intangível - sob o jugo das túlipas - a boca - interminável - compassiva - através das cortinas - o esguio - corpo – e essa lucidez do aéreo - que omoplata silenciosa - mão escassa - se me abre – protectora - súbito o deserto - ante-manhã - a música do resguardo ?-
Porto, 9 de Outubro de 2009
quinta-feira, 8 de outubro de 2009
TREVA
Quem resvala na treva da voz pelo inesperado
Vacila na palavra nua que o efémero acalenta
Junto do círio a arder ilumina os signos do céu
O exausto corpo o fulgor da cegueira inconciliável
Vacila na palavra nua que o efémero acalenta
Junto do círio a arder ilumina os signos do céu
O exausto corpo o fulgor da cegueira inconciliável
INSTANTÂNEO
Quem permanece inerme sob a voz
Que o corpo apronta – saciado -
Quem se detêm pelo obscuro - hermético -
Nessa terra de ninguém – cego – se precipita
Sob a luz dos daguerreótipos – emerso -
Ante o que se remove – ousa fixar - o infindo -
No rasto da película - divisa o intantâneo –
A imagem nua – o tácito fulgor – do inominável
Que o corpo apronta – saciado -
Quem se detêm pelo obscuro - hermético -
Nessa terra de ninguém – cego – se precipita
Sob a luz dos daguerreótipos – emerso -
Ante o que se remove – ousa fixar - o infindo -
No rasto da película - divisa o intantâneo –
A imagem nua – o tácito fulgor – do inominável
NOS CONFINS DO REMOTO
1.
- com que intento permaneces - ante a tela branca - pelo inarticulado - na constância - da luz astral - o alarme - junto à saciedade do azul - retomas – a voz do insone -
2.
- a imagem dourada da insónia - o que se desmorona sobre a amplidão – junto ao teu corpo desabrigado - nos confins do remoto - a indagação mortal -
3.
- evola-se meu ser na noite - sob o manto da penúria - o que é fiel - prelúdio extático - da nudez -
4.
estender-me sobre o seio - a lâmpada estilhaçada - sibilante - a voz da deserção - opaca – secreta - o que aparta alusivo - pela intempérie - há muito pressentida - o que se repercute - velado -
Porto, 8 Outubro 2009
- com que intento permaneces - ante a tela branca - pelo inarticulado - na constância - da luz astral - o alarme - junto à saciedade do azul - retomas – a voz do insone -
2.
- a imagem dourada da insónia - o que se desmorona sobre a amplidão – junto ao teu corpo desabrigado - nos confins do remoto - a indagação mortal -
3.
- evola-se meu ser na noite - sob o manto da penúria - o que é fiel - prelúdio extático - da nudez -
4.
estender-me sobre o seio - a lâmpada estilhaçada - sibilante - a voz da deserção - opaca – secreta - o que aparta alusivo - pela intempérie - há muito pressentida - o que se repercute - velado -
Porto, 8 Outubro 2009
segunda-feira, 5 de outubro de 2009
Ciel de Soleil
Je vois du ciel – trop beau – le soleil devant mon sommeil- jusqu’a perde la raison – ses yeux – dans l’azur
Ton sommeil se pressent – faisait face au soleil – allait de tous parts cerner le mien
Se voile la face belle – doucement – tu resplendiras
Suis-moi – dans la folle mélodie – la passion – insondable – la rumeur des anges
Comment fixer - le plaisir – partager les mots assidus – aux confins du corp – le feu – dans la nuit
Si lentement ton regard – Qui va allumer ma lampe – et la respiration – le secret du jour en feu
Je veux atteindre – des murmures de l’eau – ce ciel – d’une voix – sensuelle – passionne
Qui cède aux chemins de la solitude – de l’aventure – attendre la musique du silence – le rythme du coeur?
Ton sommeil se pressent – faisait face au soleil – allait de tous parts cerner le mien
Se voile la face belle – doucement – tu resplendiras
Suis-moi – dans la folle mélodie – la passion – insondable – la rumeur des anges
Comment fixer - le plaisir – partager les mots assidus – aux confins du corp – le feu – dans la nuit
Si lentement ton regard – Qui va allumer ma lampe – et la respiration – le secret du jour en feu
Je veux atteindre – des murmures de l’eau – ce ciel – d’une voix – sensuelle – passionne
Qui cède aux chemins de la solitude – de l’aventure – attendre la musique du silence – le rythme du coeur?
LUCIDEZ
quarta-feira, 30 de setembro de 2009
LES INSTANTS (DÉ)COMPOSÉS NA POESIA DE ELISABETE PIRES MONTEIRO
1. LE LOINTAIN DÉSERT
T'ais-je un jour connu?
Mirage dans le lointain désert
Source qui a puisé l'existence
Je t'ai connu bien avant que ton corps naisse.
2. DES NONS DE L`ÂME
Pourquoi n'es-tu pas juste une âme?
Au lieu d'un corp qui torturerais le mien
Tu serais lá pour me completer
Je t'ai cherché partout mais tu n'étais pas visible
Restes, ne t'envoles pas à nouveau
3. TEMPS ET ÊTRE
A quoi bon chercher le temps si celui-ci est impalpable
Y a t-il encore des traces de moi
dans ce décor inchangeable?Où es-tu?
Je ne t'entends plus. Qui es-tu?
Elisabete Pires Monteiro
27/05/2009 Saint-Benoît-sur-Loire
4. SAINT-GERMAIN
Saint-Germain je vois des pieds partout
Tant de pieds et je ne les vois plus!
Pourquoi mon coeur à remplacer mes yeux
et ne me laisse plus rien voir du tout
Elisabete Pires Monteiro
31/05/2009 Paris
T'ais-je un jour connu?
Mirage dans le lointain désert
Source qui a puisé l'existence
Je t'ai connu bien avant que ton corps naisse.
2. DES NONS DE L`ÂME
Pourquoi n'es-tu pas juste une âme?
Au lieu d'un corp qui torturerais le mien
Tu serais lá pour me completer
Je t'ai cherché partout mais tu n'étais pas visible
Restes, ne t'envoles pas à nouveau
3. TEMPS ET ÊTRE
A quoi bon chercher le temps si celui-ci est impalpable
Y a t-il encore des traces de moi
dans ce décor inchangeable?Où es-tu?
Je ne t'entends plus. Qui es-tu?
Elisabete Pires Monteiro
27/05/2009 Saint-Benoît-sur-Loire
4. SAINT-GERMAIN
Saint-Germain je vois des pieds partout
Tant de pieds et je ne les vois plus!
Pourquoi mon coeur à remplacer mes yeux
et ne me laisse plus rien voir du tout
Elisabete Pires Monteiro
31/05/2009 Paris
segunda-feira, 28 de setembro de 2009
O testemunho do “de-fora”
A diferença como base
Michel Foucault chamou a atenção para a formação discursiva (a senda dos enunciados que nos envolvem). Considera - segundo os seus próprios termos - que o “curso” da história - o núcleo central da narrativa da acção humana - desde o passado até ao presente - é uma espécie de ilusão. Recorde-se que o passado – como inscrição – doação - assinatura do mundo – é sempre uma invenção do presente - e, em consequência, um fardo. O problema é que o homem se vê circunscrito à (inaceitável) violência - ao fechamento cognitivo - às patologias do social. Mas a questão talvez se coloque nestes termos: somos coisas insignificantes e raramente nos pertencemos. A relação com o “de-fora” - a exterioridade selvagem - tende a prevalecer. Não, o homem não é a medida de todas as coisas. Será sempre um ser paradoxal - in-situado – imerso no demoníaco da linguagem - que, em sentido próprio, acaba por reproduzir inevitavelmente as (macro)estruturas estabelecidas.
anómalo
Compreende-se o servo mecanismo das organizações e instituições cada vez que o ser humano incorpora - de forma subjacente - a herança e os automatismos culturais. Elas trazem-o de volta a uma “normalidade” - sinuosa - às atitudes mentais (pré)formatadas. Podemos entrever comportamentos num espectro normativo – de resistência e transferência expresso em sintomas – e, por conseguinte, de incorporação dos códigos da violência institucionalizada. Ocupemo-nos da experiência (inconsciente) do mundo partindo do que nos força ao reajuste, isto é, à produção de sujeitos dóceis. Os ricos tornam-se ostensivamente mais ricos e aqueles que não têm trabalho são cada vez mais excluídos da sociedade oficial. Situamo-nos, assim, em plena problemática da lógica do capital e do mercado, da loucura privativa. A diferença está na massa crescente de seres humanos a soçobrar na depressão e no desespero. Nada é inocente, sentencia Michel Foucalt. Não é ocioso fazer esta constatação. A sociedade disciplinar (que se escuda no poder da norma) acabou por criar dispositivos para vigiar e punir (que nos amesquinham). O homem encontra-se tutelado pelos centros de decisão, as formas e os tipos de controle. Ele é múltiplo e vive no múltiplo. Emerso na ordem contingente – na vulnerabilidade - sente-se livre e preso ao mesmo tempo.
(in)coerência
O ser humano – no seu acúmulo de informação - tende à aparente (in)coerência - remete-se – nas palavras de Henri Laborit - ao aprendizado da recompensa e da punição. Além das explosões de agressividade competitiva e da busca da dominação - no quadro inter individual sócio-histórico - temos a agressividade ou as depressões. Parte-se de três eixos básicos: o saber, o poder, o si (cujas formas do conteúdo variam com a história). Não fica aqui deslocado lembrar que tudo se torna transitório e mortal - anómalo e (dis)contínuo- prevalecendo o comportamento territorial predador. Tudo quanto se disse reporta ao problema da agressividade constitucional do ser humano contra o outro. Nosso pressuposto é o do “riso soberano” - a (auto)contradição. Aqui a multiplicidade não se esconde; acentuemos somente o que nos vincula à linguagem e às construções imaginárias - o campo da política da revolta - o (auto)despredimento e a (auto)invenção? Poética?
“desolação”
Hoje questiona-se a capacidade da razão de produzir conhecimentos verdadeiros (e mesmo, eventualmente, de construir “normas” para vida melhores). Como explicar a nossa actual acomodação à desolação da vida quotidiana? Como explicar hoje que a transgressão seja um meio essencial de dominação? Emersos no jogo social (hiper)festivo – arbitrário - que inclui o apelo humanitário e o caritativo – onde se pode associar a afirmação de um eu tribalizado, globalizado, universalizado, – assiste-se, na verdade, à revelação da comédia da existência e da existência como comédia. Percebe-se que estamos no limiar de um salto no desconhecido que destruirá todas as nossas maneiras de pensar fundadas nas relações entre indivíduos (neotônicas) e espécies (naturais). Todos conhecemos os seus bastidores mais imediatos - comerciantes e banqueiros sem escrúpulos, mágicos suspeitos, médicos e os sábios recorrendo à fabricação de uma “pós-humanidade”. Poderíamos, portanto, afirmar que o que está em causa é o corpo que tem por estrutura um estado de neotenia permanente? Como pôr cobro a este andar às cegas?
dependência
Nesta nova era técnico-científica amplia-se o grau de vulnerabilidade e, não o esqueçamos, de humilhação pessoal. Não hesitamos aqui em referirmo-nos a uma sociedade que parta de facto que a fragilidade e a dependência é algo que todos os indivíduos experimentam em algum momento da sua vida (Alasdair MacIntyre, Animales racionales y dependientes. Porqué los seres humanos necessitamos las virtudes, Barcelona, Paidós, 2001, p. 154). Antes de mais nada, impõe-se uma verificação: a centralidade da vulnerabilidade humana que tem múltiplas facetas. O homem - enquanto animal, ser vivo, corporeidade e anima, - é vulnerável. Enquanto neoteno – termo inventado pelo antomista holandês Louis Bolk - está predisposto à domesticação. Falamos não simplesmente da aceleração dos fenómenos ligados à globalização e das tecnologias da informação que, na maior parte dos casos, transformaram a nossa experiência do espaço e do tempo, mas do declínio das grandes narrativas e do enfraquecimento de agências nômicas tradicionais (a religião e a política).
Paradoxo
Também é necessário fazer referência ao paradoxo (a omnipresença do paradoxo). O mundo do paradoxo é o mundo da síntese impossível. A verdade é que a lógica do paradoxo e a lógica da loucura entrecruzam-se. Pensar o impensável é, essencialmente, pensar o paradoxo e, mais particularmente, o carácter aporético do paradoxo (que pode, com frequência tomar o sentido de um problema insolúvel). Também é preciso não esquecer que a estrutura mesma do real é paradoxal. Mas isso introduz-nos já na relação originária entre o pensamento e o ser que institui-se na ligação ao paradoxo. Ora se a realidade é paradoxal, o pensamento não pode senão constituir-se na paradoxalidade. Constatamos, por conseguinte, que a estrutura paradoxal do real determina da mesma maneira a do pensamento. Julgamos, por isso, que o paradoxo é necessário para determinar a nossa condição humana. Para Pascal, o paradoxo está presente em tudo, do discurso sobre a realidade à realidade ela própria. Seguramente. Entendemos por isso que é preciso assumir – como assinalava Kierkegaard - o paradoxo.
Natalidade
A palavra humanismo adquiriu uma força mágica. Será lícito o simples desejo de definir em que consiste a humanidade do homem? Quando o humanismo funciona como uma matriz, inclusiva e excludente ao mesmo tempo? Compreendemos hoje a necessidade da abertura a maneiras novas de ser sujeito num mundo de diferenças. O homem é, para usarmos a terminologia de Hannah Arendt, um “initium”, um princípio e um principiante. Actuar está – por conseguinte - estreitamente relacionado com um dos aspectos mais gerais da existência humana, a natalidade. Uma coisa porém é certa: vivemos na sombra de uma época histórica em que o genocídio esteve motivado e justificado por uma definição do “verdadeiro” homem. Todos nós estamos sujeitos às consequências da pluralidade humana e portanto das variações de uma natureza humana universal. É necessário, pois, abandonar a ideia de que conhecer o outro é uma condição necessária e suficiente para estabelecer uma relação com ele. Como quer que seja, o ponto decisivo é a diferença, ela corresponde ao facto de que somos distintos e que as diferenças existem exactamente tal como as experimentamos e deparamos. Ora, sucede que a diferença, na opinião de Gert Biesta, nos exige outra atitude face à pluralidade e a alteridade, aquela em que noções como respeito, compaixão e responsabilidade tenham prioridade sobre noções como conhecimento e compreensão (Acerca de la humanidade in Mensajes e-ducativos desde tierra de nadie, p. 123, Barcelona, 2006). Torna-se imperiosa uma linguaguem para a experência (onde se deixa adivinhar a voz da paixão). E, no entanto, a língua da conversação, propriamente dita (como contraposição a essa língua neutra em que articulam os discursos técnico-científicos). Evidentemente a experiência é sempre do singular, não do individual ou do particular mas do singular. “E o singular, segundo Jorge Larrrosa, é precisamente aquilo do que não pode haver ciência, mas sim paixão” (Una lengua para la conversación in Mensajes e-ducativos desde tierra de nadie, p. 53, Barcelona, 2006). A experiência, neste caso, tem a ver com o não-saber, com o limite do que não sabemos. E deste modo, tem a ver com o não-dizer, com o limite do dizer.
política do sintoma
Na verdade, impõe-se-nos falar da psicanálise cujo centro e núcleo é da ordem do “impossível” (no mesmo sentido que os de governar e de educar) É importante lembrar que a psicanálise opera pela palavra. Efectivamente o trabalho de cura analítica consiste em tornar possível o advento de uma palavra no lugar do sintoma. Trata-se aqui de dar-se efectivamente relevo à palavra e ao pensamento. É, portanto, correcto dizer-se que o sintoma fala. Sucede que o sintoma tem a “verdade” como causa, mas é da “mentira” que ele nasce. O autor de “Três ensaios sobre a sexualidade” descobriu - num certo momento - que o segredo da análise se situa na “transferência”. Colocou, indubitavelmente, em evidência, o que nela fazia obstáculo, a saber, a “resistência”. E não ficamos por aqui. Ele concebeu a pulsão de morte como destrutividade autónoma. Ainda melhor: pôs a claro a necessidade de dar relevo à pulsão da morte (enquanto disjuntiva, separadora e geradora de negações) que seria o outro pólo do libido. Isso explica a silhueta lúcifer-amor - que delimita o essencial da problemática levantada pela neurose e revelada pela experiência analítica. Os indivíduos, segundo Siegmund Freud, tornam-se nevróticos por haverem reprimido demasiado os seus desejos e instintos. Ele reconheceu (de facto) o fardo que a existência representa para o ser humano. Todo o ênfase recai na insatisfação humana. O autor de “O futuro de uma ilusão” situou “a infelicidade geral” da sociedade como o limite da terapêutica e da normalidade.
Vontade de destruição
Não é menos evidente a conclusão de que somos seres fundamentalmente psicóticos. Não é psicótico o que é “alienado” ou, para empregar a terminologia de R.D. Laing, “o que tem a personalidade dividida”, mas a personalidade “normal”. A alienação e a cisão são, certamente, as condições básicas para a nossa normalidade repressiva e seus aparatos de instituções anti-humanas. Existe um elo inconsciente que liga os indivíduos aos seus senhores. Esse será um processo de esclarecer, simultaneamente, a figura da dominação e servidão (o senhor e o escravo). O adversário está em nós. Resumindo: vivemos para destruir. Essa “vontade de destruição” (no sentido que lhe dá Lacan) corresponde, não só, como foi dito várias vezes, à aceitação da maldade originária no homem, mas também (precisamente) a maldade que se exerce não em nome do princípio do prazer ou que se coloque a serviço da sexualidade, mas que se afirma independentemente de ambos.
ser-para
Não podemos deixar de mencionar o facto de que uma das noções que se encontram em estado implícito em toda a parte onde há homens, é da “responsabilidade” para com “outrem” (que é pano de fundo da obra de Emmanuel Lévinas). Quer dizer: o homem toma seu sentido maior na sua relação com o outro homem, com o próximo. Chegamos, assim, ao problema da “morada” do humano que não é mais simplesmente ser mas “ser para”. Parte-se da consideração dos sábios fariseus que atribuem o mal à liberdade humana. Não se pode encarar a história a não ser como um que “fazer humano”. Torna-se forçoso verificar que o judaísmo não conhece este reconhecimento da permanência e da recorrência do vórtice do mal que introduz o mundo cristão como dogma do pecado original. Daqui que resulta a importância primeira concedida à exigência ética. Neste sentido a experiência moral mosaico-profética (confontada com a grega) tem uma real significação pelo facto de se centrar no apelo vindo do outro, presente em carne e osso. “Sucede que, segundo Denis de Rougemont, nós temos uma experiência mais concreta e mais convincente do mal e do erro do que do bem e da verdade” (La part du diable, Paris, 1982, p. 231).
Amor/cura/caminhar
Temos debatido a questão do medo. Um dos seus fundamentos reside no facto de nos expormos e de nos assumirmos pelos padrões de invisibilidade. Entre as culturas indígenas a atenção ao que tem coração e significado torna-se crucial para se compreender precisamente a valorização da lógica do dom que exige partilha. Aqui eros - o amor - é uma porta para a cura. Falamos do princípio de reciprocidade, da capacidade de dar e receber, da capacidade de vincular-se, da própria comunhão. É um ponto importantíssimo. De resto, temos de perguntar-nos como é que as culturas apresentam suas próprias formas de manutenção de saúde e bem estar. Devemos pôr em evidência os quatro bálsamos da cura: contar histórias, o canto, a dança e o silêncio. Nas sociedades xamânicas o ritual e o cerimonial permitiam o acesso à psico mitologia – ou trabalho com imagens e memória. O problema é o sabermos como maximalizar a liberdade de tal modo que isso tenha como efeito a a minimilazação da coação. A ideia fundamental é a da abertura a novos horizontes. O que importa é sermos caminhantes e viajantes. Uma vez mais se verifica aquela verdade: caminhar consiste em uma ex – posição, em um estar fora de posição. O que é decisivo é ver o visível
Porto, 28 de Setembro de 2009
A diferença como base
Michel Foucault chamou a atenção para a formação discursiva (a senda dos enunciados que nos envolvem). Considera - segundo os seus próprios termos - que o “curso” da história - o núcleo central da narrativa da acção humana - desde o passado até ao presente - é uma espécie de ilusão. Recorde-se que o passado – como inscrição – doação - assinatura do mundo – é sempre uma invenção do presente - e, em consequência, um fardo. O problema é que o homem se vê circunscrito à (inaceitável) violência - ao fechamento cognitivo - às patologias do social. Mas a questão talvez se coloque nestes termos: somos coisas insignificantes e raramente nos pertencemos. A relação com o “de-fora” - a exterioridade selvagem - tende a prevalecer. Não, o homem não é a medida de todas as coisas. Será sempre um ser paradoxal - in-situado – imerso no demoníaco da linguagem - que, em sentido próprio, acaba por reproduzir inevitavelmente as (macro)estruturas estabelecidas.
anómalo
Compreende-se o servo mecanismo das organizações e instituições cada vez que o ser humano incorpora - de forma subjacente - a herança e os automatismos culturais. Elas trazem-o de volta a uma “normalidade” - sinuosa - às atitudes mentais (pré)formatadas. Podemos entrever comportamentos num espectro normativo – de resistência e transferência expresso em sintomas – e, por conseguinte, de incorporação dos códigos da violência institucionalizada. Ocupemo-nos da experiência (inconsciente) do mundo partindo do que nos força ao reajuste, isto é, à produção de sujeitos dóceis. Os ricos tornam-se ostensivamente mais ricos e aqueles que não têm trabalho são cada vez mais excluídos da sociedade oficial. Situamo-nos, assim, em plena problemática da lógica do capital e do mercado, da loucura privativa. A diferença está na massa crescente de seres humanos a soçobrar na depressão e no desespero. Nada é inocente, sentencia Michel Foucalt. Não é ocioso fazer esta constatação. A sociedade disciplinar (que se escuda no poder da norma) acabou por criar dispositivos para vigiar e punir (que nos amesquinham). O homem encontra-se tutelado pelos centros de decisão, as formas e os tipos de controle. Ele é múltiplo e vive no múltiplo. Emerso na ordem contingente – na vulnerabilidade - sente-se livre e preso ao mesmo tempo.
(in)coerência
O ser humano – no seu acúmulo de informação - tende à aparente (in)coerência - remete-se – nas palavras de Henri Laborit - ao aprendizado da recompensa e da punição. Além das explosões de agressividade competitiva e da busca da dominação - no quadro inter individual sócio-histórico - temos a agressividade ou as depressões. Parte-se de três eixos básicos: o saber, o poder, o si (cujas formas do conteúdo variam com a história). Não fica aqui deslocado lembrar que tudo se torna transitório e mortal - anómalo e (dis)contínuo- prevalecendo o comportamento territorial predador. Tudo quanto se disse reporta ao problema da agressividade constitucional do ser humano contra o outro. Nosso pressuposto é o do “riso soberano” - a (auto)contradição. Aqui a multiplicidade não se esconde; acentuemos somente o que nos vincula à linguagem e às construções imaginárias - o campo da política da revolta - o (auto)despredimento e a (auto)invenção? Poética?
“desolação”
Hoje questiona-se a capacidade da razão de produzir conhecimentos verdadeiros (e mesmo, eventualmente, de construir “normas” para vida melhores). Como explicar a nossa actual acomodação à desolação da vida quotidiana? Como explicar hoje que a transgressão seja um meio essencial de dominação? Emersos no jogo social (hiper)festivo – arbitrário - que inclui o apelo humanitário e o caritativo – onde se pode associar a afirmação de um eu tribalizado, globalizado, universalizado, – assiste-se, na verdade, à revelação da comédia da existência e da existência como comédia. Percebe-se que estamos no limiar de um salto no desconhecido que destruirá todas as nossas maneiras de pensar fundadas nas relações entre indivíduos (neotônicas) e espécies (naturais). Todos conhecemos os seus bastidores mais imediatos - comerciantes e banqueiros sem escrúpulos, mágicos suspeitos, médicos e os sábios recorrendo à fabricação de uma “pós-humanidade”. Poderíamos, portanto, afirmar que o que está em causa é o corpo que tem por estrutura um estado de neotenia permanente? Como pôr cobro a este andar às cegas?
dependência
Nesta nova era técnico-científica amplia-se o grau de vulnerabilidade e, não o esqueçamos, de humilhação pessoal. Não hesitamos aqui em referirmo-nos a uma sociedade que parta de facto que a fragilidade e a dependência é algo que todos os indivíduos experimentam em algum momento da sua vida (Alasdair MacIntyre, Animales racionales y dependientes. Porqué los seres humanos necessitamos las virtudes, Barcelona, Paidós, 2001, p. 154). Antes de mais nada, impõe-se uma verificação: a centralidade da vulnerabilidade humana que tem múltiplas facetas. O homem - enquanto animal, ser vivo, corporeidade e anima, - é vulnerável. Enquanto neoteno – termo inventado pelo antomista holandês Louis Bolk - está predisposto à domesticação. Falamos não simplesmente da aceleração dos fenómenos ligados à globalização e das tecnologias da informação que, na maior parte dos casos, transformaram a nossa experiência do espaço e do tempo, mas do declínio das grandes narrativas e do enfraquecimento de agências nômicas tradicionais (a religião e a política).
Paradoxo
Também é necessário fazer referência ao paradoxo (a omnipresença do paradoxo). O mundo do paradoxo é o mundo da síntese impossível. A verdade é que a lógica do paradoxo e a lógica da loucura entrecruzam-se. Pensar o impensável é, essencialmente, pensar o paradoxo e, mais particularmente, o carácter aporético do paradoxo (que pode, com frequência tomar o sentido de um problema insolúvel). Também é preciso não esquecer que a estrutura mesma do real é paradoxal. Mas isso introduz-nos já na relação originária entre o pensamento e o ser que institui-se na ligação ao paradoxo. Ora se a realidade é paradoxal, o pensamento não pode senão constituir-se na paradoxalidade. Constatamos, por conseguinte, que a estrutura paradoxal do real determina da mesma maneira a do pensamento. Julgamos, por isso, que o paradoxo é necessário para determinar a nossa condição humana. Para Pascal, o paradoxo está presente em tudo, do discurso sobre a realidade à realidade ela própria. Seguramente. Entendemos por isso que é preciso assumir – como assinalava Kierkegaard - o paradoxo.
Natalidade
A palavra humanismo adquiriu uma força mágica. Será lícito o simples desejo de definir em que consiste a humanidade do homem? Quando o humanismo funciona como uma matriz, inclusiva e excludente ao mesmo tempo? Compreendemos hoje a necessidade da abertura a maneiras novas de ser sujeito num mundo de diferenças. O homem é, para usarmos a terminologia de Hannah Arendt, um “initium”, um princípio e um principiante. Actuar está – por conseguinte - estreitamente relacionado com um dos aspectos mais gerais da existência humana, a natalidade. Uma coisa porém é certa: vivemos na sombra de uma época histórica em que o genocídio esteve motivado e justificado por uma definição do “verdadeiro” homem. Todos nós estamos sujeitos às consequências da pluralidade humana e portanto das variações de uma natureza humana universal. É necessário, pois, abandonar a ideia de que conhecer o outro é uma condição necessária e suficiente para estabelecer uma relação com ele. Como quer que seja, o ponto decisivo é a diferença, ela corresponde ao facto de que somos distintos e que as diferenças existem exactamente tal como as experimentamos e deparamos. Ora, sucede que a diferença, na opinião de Gert Biesta, nos exige outra atitude face à pluralidade e a alteridade, aquela em que noções como respeito, compaixão e responsabilidade tenham prioridade sobre noções como conhecimento e compreensão (Acerca de la humanidade in Mensajes e-ducativos desde tierra de nadie, p. 123, Barcelona, 2006). Torna-se imperiosa uma linguaguem para a experência (onde se deixa adivinhar a voz da paixão). E, no entanto, a língua da conversação, propriamente dita (como contraposição a essa língua neutra em que articulam os discursos técnico-científicos). Evidentemente a experiência é sempre do singular, não do individual ou do particular mas do singular. “E o singular, segundo Jorge Larrrosa, é precisamente aquilo do que não pode haver ciência, mas sim paixão” (Una lengua para la conversación in Mensajes e-ducativos desde tierra de nadie, p. 53, Barcelona, 2006). A experiência, neste caso, tem a ver com o não-saber, com o limite do que não sabemos. E deste modo, tem a ver com o não-dizer, com o limite do dizer.
política do sintoma
Na verdade, impõe-se-nos falar da psicanálise cujo centro e núcleo é da ordem do “impossível” (no mesmo sentido que os de governar e de educar) É importante lembrar que a psicanálise opera pela palavra. Efectivamente o trabalho de cura analítica consiste em tornar possível o advento de uma palavra no lugar do sintoma. Trata-se aqui de dar-se efectivamente relevo à palavra e ao pensamento. É, portanto, correcto dizer-se que o sintoma fala. Sucede que o sintoma tem a “verdade” como causa, mas é da “mentira” que ele nasce. O autor de “Três ensaios sobre a sexualidade” descobriu - num certo momento - que o segredo da análise se situa na “transferência”. Colocou, indubitavelmente, em evidência, o que nela fazia obstáculo, a saber, a “resistência”. E não ficamos por aqui. Ele concebeu a pulsão de morte como destrutividade autónoma. Ainda melhor: pôs a claro a necessidade de dar relevo à pulsão da morte (enquanto disjuntiva, separadora e geradora de negações) que seria o outro pólo do libido. Isso explica a silhueta lúcifer-amor - que delimita o essencial da problemática levantada pela neurose e revelada pela experiência analítica. Os indivíduos, segundo Siegmund Freud, tornam-se nevróticos por haverem reprimido demasiado os seus desejos e instintos. Ele reconheceu (de facto) o fardo que a existência representa para o ser humano. Todo o ênfase recai na insatisfação humana. O autor de “O futuro de uma ilusão” situou “a infelicidade geral” da sociedade como o limite da terapêutica e da normalidade.
Vontade de destruição
Não é menos evidente a conclusão de que somos seres fundamentalmente psicóticos. Não é psicótico o que é “alienado” ou, para empregar a terminologia de R.D. Laing, “o que tem a personalidade dividida”, mas a personalidade “normal”. A alienação e a cisão são, certamente, as condições básicas para a nossa normalidade repressiva e seus aparatos de instituções anti-humanas. Existe um elo inconsciente que liga os indivíduos aos seus senhores. Esse será um processo de esclarecer, simultaneamente, a figura da dominação e servidão (o senhor e o escravo). O adversário está em nós. Resumindo: vivemos para destruir. Essa “vontade de destruição” (no sentido que lhe dá Lacan) corresponde, não só, como foi dito várias vezes, à aceitação da maldade originária no homem, mas também (precisamente) a maldade que se exerce não em nome do princípio do prazer ou que se coloque a serviço da sexualidade, mas que se afirma independentemente de ambos.
ser-para
Não podemos deixar de mencionar o facto de que uma das noções que se encontram em estado implícito em toda a parte onde há homens, é da “responsabilidade” para com “outrem” (que é pano de fundo da obra de Emmanuel Lévinas). Quer dizer: o homem toma seu sentido maior na sua relação com o outro homem, com o próximo. Chegamos, assim, ao problema da “morada” do humano que não é mais simplesmente ser mas “ser para”. Parte-se da consideração dos sábios fariseus que atribuem o mal à liberdade humana. Não se pode encarar a história a não ser como um que “fazer humano”. Torna-se forçoso verificar que o judaísmo não conhece este reconhecimento da permanência e da recorrência do vórtice do mal que introduz o mundo cristão como dogma do pecado original. Daqui que resulta a importância primeira concedida à exigência ética. Neste sentido a experiência moral mosaico-profética (confontada com a grega) tem uma real significação pelo facto de se centrar no apelo vindo do outro, presente em carne e osso. “Sucede que, segundo Denis de Rougemont, nós temos uma experiência mais concreta e mais convincente do mal e do erro do que do bem e da verdade” (La part du diable, Paris, 1982, p. 231).
Amor/cura/caminhar
Temos debatido a questão do medo. Um dos seus fundamentos reside no facto de nos expormos e de nos assumirmos pelos padrões de invisibilidade. Entre as culturas indígenas a atenção ao que tem coração e significado torna-se crucial para se compreender precisamente a valorização da lógica do dom que exige partilha. Aqui eros - o amor - é uma porta para a cura. Falamos do princípio de reciprocidade, da capacidade de dar e receber, da capacidade de vincular-se, da própria comunhão. É um ponto importantíssimo. De resto, temos de perguntar-nos como é que as culturas apresentam suas próprias formas de manutenção de saúde e bem estar. Devemos pôr em evidência os quatro bálsamos da cura: contar histórias, o canto, a dança e o silêncio. Nas sociedades xamânicas o ritual e o cerimonial permitiam o acesso à psico mitologia – ou trabalho com imagens e memória. O problema é o sabermos como maximalizar a liberdade de tal modo que isso tenha como efeito a a minimilazação da coação. A ideia fundamental é a da abertura a novos horizontes. O que importa é sermos caminhantes e viajantes. Uma vez mais se verifica aquela verdade: caminhar consiste em uma ex – posição, em um estar fora de posição. O que é decisivo é ver o visível
Porto, 28 de Setembro de 2009
ROSA ALCHÉMICA
- Quem se detém na treva iluminada - desconfia do terrestre -
E todavia se desdobra - nesse perspicare ad infinitum -
Permanece como um apátrida - na errância - sobre a pedra - alucinada -
Quem cala a justeza da literatura - a mestria da obra - o irreprimível
Quem nesse apego do simples - arcana verba - irrompe na scriptura -
Pela voz do impensado se ajusta ao assombro - da voz - o que emudece -
Quem renuncia - ó rosa alchemica - ao coração - o resplendor da carne -
Nesse ímpeto da prestidigitação - da arte - ignora o actual momento egípcio -
Na proximidade do tremor e temor se precipita no transitório - até às nuvens -
Entre os lábios - não conhece códigos - ante os relâmpagos - fica à merce do caos
Quem enaltece este tempo de assassinos - os fedeli d'amore - as altas torres –
E todavia se desdobra - nesse perspicare ad infinitum -
Permanece como um apátrida - na errância - sobre a pedra - alucinada -
Quem cala a justeza da literatura - a mestria da obra - o irreprimível
Quem nesse apego do simples - arcana verba - irrompe na scriptura -
Pela voz do impensado se ajusta ao assombro - da voz - o que emudece -
Quem renuncia - ó rosa alchemica - ao coração - o resplendor da carne -
Nesse ímpeto da prestidigitação - da arte - ignora o actual momento egípcio -
Na proximidade do tremor e temor se precipita no transitório - até às nuvens -
Entre os lábios - não conhece códigos - ante os relâmpagos - fica à merce do caos
Quem enaltece este tempo de assassinos - os fedeli d'amore - as altas torres –
sexta-feira, 25 de setembro de 2009
volúpia do cisne
Perpetuas a volúpia do cisne
Sobre os plátanos a lucidez
Do corpo quando te despes
nuvens do obstinado
Que corpo fugaz se insinua
Nas nuvens do obstinado
Inebriado me arrebata
Ancas e ombros toda a temeridade
nudez do sumptuoso
Dir-te-ei a voz da loucura
O corpo do inominável
A nudez do sumptuoso
Na penumbra dos sinais
Perpetuas a volúpia do cisne
Sobre os plátanos a lucidez
Do corpo quando te despes
nuvens do obstinado
Que corpo fugaz se insinua
Nas nuvens do obstinado
Inebriado me arrebata
Ancas e ombros toda a temeridade
nudez do sumptuoso
Dir-te-ei a voz da loucura
O corpo do inominável
A nudez do sumptuoso
Na penumbra dos sinais
quinta-feira, 24 de setembro de 2009
Foto
A foto do jovem malcolm lowry
Me revela o anónimo - o desastre -
O que se furta à voz impenetrável
Da desolação - o inalcançável -
Amesterdam
Diante da sinagoga de amesterdam
Sob a pedra as cúpulas humedecidas
Rompendo a penumbra a voz do ileso
A memória da circuncisão inextinguível
Treva
Quem resvala na treva da voz pelo inesperado
Vacila na palavra junto do círio a arder ilumina
O exausto corpo o fulgor da cegueira inconciliável
Tremor
Permaneço nessa desmesura
Dos sinais, perdido
Em chamas
Pelo teu corpo alucinado
A veemência do tremor
Certeza do incerto
Junto ao que subsiste
Com estranheza
A magnólia, a voz
Do esquivo corpo
O que se apossa
Na certeza do incerto
Incólume
Quem ilumina a lucidez do obscuro
Na demência das palavras o incólume
Permanece junto do inapreensível
Sob as abóbadas e os crisântemos
A foto do jovem malcolm lowry
Me revela o anónimo - o desastre -
O que se furta à voz impenetrável
Da desolação - o inalcançável -
Amesterdam
Diante da sinagoga de amesterdam
Sob a pedra as cúpulas humedecidas
Rompendo a penumbra a voz do ileso
A memória da circuncisão inextinguível
Treva
Quem resvala na treva da voz pelo inesperado
Vacila na palavra junto do círio a arder ilumina
O exausto corpo o fulgor da cegueira inconciliável
Tremor
Permaneço nessa desmesura
Dos sinais, perdido
Em chamas
Pelo teu corpo alucinado
A veemência do tremor
Certeza do incerto
Junto ao que subsiste
Com estranheza
A magnólia, a voz
Do esquivo corpo
O que se apossa
Na certeza do incerto
Incólume
Quem ilumina a lucidez do obscuro
Na demência das palavras o incólume
Permanece junto do inapreensível
Sob as abóbadas e os crisântemos
terça-feira, 22 de setembro de 2009
Depressão, purgatório e “mobile phone”
Na arte actual torna-se relevante a questão da depressão. É absolutamente exacto, e a poesia e o discurso político-ideológico actual o confirmam, que estamos confrontados com a emergência – no sentido mais genérico - de um paradigma depressivo. Isto é em parte assim porque a depressão é um estado inscrito na experiência profunda do ser contemporâneo. O huis clos do isolamento e a ruptura da intersubjectividade comunicacional deve ser tomado num sentido amplo, designando a hegemonia das dis-funções e o registro de uma constelação psíquica da personalidade neurasténica e esquizofrénica. Só que hoje, muito simplesmente, já ninguém crê na cartilha “surrealista” da libertação do inconsciente por meio da escrita automática. Ficou para trás a própria validade das vanguardas, marcadas pelo niiilismo e a subversão, no momento quem que assiste ao triunfo da estética e da época da “vaporização da arte”. Mas por degraus quase imperceptíveis acabou por se afirmar, ou pelo menos, ou enunciar o tema da vulnerabilidade (o informe, o inumano, o patético e, portanto, a concepção da arte como excreção) ou, precisamente, da relação catastrófica - apocalíptica - com o tempo.
Debilitamento
Numerosos factores contribuem para a aceitabilidade do paradigma depressivo ligado à essência mesma do moderno. Já ninguém crê nas promessas de felicidade. Nada mais nos satisfaz. A democracia “estabelecida”, “instalada”, ou “mercantilista” europeia, após um século, vê-se de novo repleta de excluídos e de novos escravos. É bem paradoxal ver que as nossas sociedades ricas e livres parecem também incapazes de exercer duravelmente uma influência emancipadora sobre o resto do mundo e, assim, o programa do consenso liberal e democrático. A experiência posterior à queda do muro de Berlim e da dissolução da URSS, em particular a partir dos anos 80, fez-nos cépticos face aos programas sociais ou políticos. Após a derrocada da razão utópica em nome da razão científica – a capitulação do colectivismo burocrático, por um lado, – e com o “fim das grandes narrativas”, anunciado por Jean François Lyotard em 1979, isto é, o desenvolvimento da democracia burguesa e da globalização - o mercado global que nos conduziu à era “pós-nacionalista” que se identifica com a sociedade da abundância à medida dos produtos de consumo, por outro lado, - já nenhuma doutrina política parece possuir o privilégio da “salvação”. Daí o fenómeno da excitação febril e embriaguez ainda em bases do “individualismo possessivo”. A ordem jurídica ocidental - converteu-se em máquina que perpetua as injustiças. Os aparelhos ideológicos e políticos vigentes já nem sequer legitimam uma aposta social precisa tendo em vista objectivos igualitários. Sabemos que o debilitamento das ideologias, o paternalismo e a retórica que há muito são parte da aura do poder político, inevitavelmente levam ao fatalismo e resignação histórica.
Cultura yupie
Não é necessário fazer um resumo minucioso. Embora imperfeito, nosso esboço é suficiente para estabelecer que estamos em plena emergência dessa economia de “casino”, com toda a especulação financeira e a formação de capital fictício (boa parte sem o lastro de qualquer crescimento real) mas também de uma cultura yupie, no sentido estrito, com os seus atavios de pequena nobreza. Aqui é preciso acentuar – com vista a ulteriores reflexões - a predominância de uma retórica obsessiva da competitividade internacional entre nações como se fossem empresas. Podemos, pois dizer que assistimos ao “fim da história”, no sentido definitivo das ideias liberais na política (democracia liberal) e na economia (capitalismo globalizado)? É importante verificar que o controle democrático – territorial – fundado no princípio da soberania do povo e um desencantado elenco de arranjos institucionais e regras – torna-se cada vez mais impotente face às forças multinacionais e internacionais da globalização. Isto significa também numa nova fase a difusão do american way of life ou da macdonaldização do consumo.
Docta spes
Muito embora o mercado como instituição-chave, o homo-economicus como modelo humano, o interesse próprio como motivação principal da acção, o individualismo como configuração triunfante recebam a menção favorável das nossas sociedades, não devemos esquecer que, como bem sugeriu Charles Taylor, existem “bens-constitutivos” que fundamentam nossas crenças e nos ajudam a implementar nossas opções. Tais bens formam parte de marcos valorativos que se desenvolvem na história. Porque falamos hoje comumente da fragmentação, da indeterminação e da intensa desconfiança de todos os discursos universais – ou para usar um termo favorito “totalizantes” (que são o marco do pensamento pós-moderno)? O que expressamente caracteriza a rejeição das meta narrativas ou das interpretações teóricas de larga escala pretensamente de aplicação universal? Quando nos deparamos, igualmente, ante a crise do pensamento iluminista? No entanto podemos e devemos – começar por referir que esta viragem não reflecte nenhuma mudança fundamental da condição social (porque, na verdade, por detrás do visível consenso liberal alguns problemas centrados na exarcebação da insegurança e da instablidade encontram abrigo na ordem colectiva). Nesta era do capitalismo tardio talvez estejamos em condições de elaborar uma visão realista e dramática do homem (onde se enobrece a cidadania moderna e o republicanismo, a utopia animada por uma docta spes). Nestas condições, como deixar de voltar a uma meditação sobre o horizonte ético e utópico, sobre o sentido de uma ética da compaixão, da libertação, da alteridade?
Catástrofe social
As desordens esquizofrénicas, o pânico, a ansiedade, o abuso de fármacos, o alcoolismo e a bi-polaridade exacerbam-se. Existem demonstrações convincentes e tangíveis de que em nossos dias a depressão assume, portanto, o perfil das tumultosas desordens psíquicas – tendo em conta o impacto da catástrofe social – que caracteriza a nossa cultura tardo-industrial. A reflexão sobre as figuras do deprimido e do pobre parecem não ter lugar na racionalidade moderna: eles embaraçam o mundo científico-técnico e o modelo económio neoliberal vigente. Escusado será dizer que o discurso científico e tecnológico escamoteando a figura do deprimido - relativizando-o - postula a “racionalização” para reconhecer a justeza e a validez da cultura tecnopolitana (a mercantilização). O historiador americano Immanuel Walerstein assinala estarmos a viver um “tempo de purgatório” – depois da extinção do wilsonismo e do leninismo - , mas pondo em evidência um tempo recheado de inúmeros problemas e de frequentes lutas carregadas mais de desespero do que de confiança. Tudo se quer privatizar: a saúde, a educação, as empresas públicas, a própria política. Apela-se aos grandes princípios do neo-liberalismo: a liberdade da empresa, a iniciativa privada, a competitividade, a maior produtividade, a agressividade comercial e a melhor qualidade de serviço (para os que podem pagá-lo).
Do in-habitual às causas perdidas
Num tempo de aceleração e de mobilização acelerada da experiência - e em que o “mobile phone” passou a ser parte de uma ideia de família, de intimidade, emergência e trabalho - a desordem social parece adquirida. Esta a situação de que teremos forçosamente de partir. A decantação, aqui apenas esboçada, permite-nos ver até onde e como a poesia – enquanto intentum estético-ético que resiste à communis opinio - pode ainda ser testemunho do nosso saeculum. A palavra secular provém do termo latino saeculum, significando “esta idade presente”. Não se pode ignorar que a poesia - contrapondo-se à luz meridiana da disciplina tecnopolitana actual e da sabedoria convencional -, pesar de muita retórica em sentido contrário, sempre alinhou com as “causas perdidas”. E, em notável grau, o in-habitual. Evidentemente: podemos considerá-la sob o ângulo da lógica do terceiro-incluído. Ou ainda: do delirium e da dementia: a exaustão do discernimento dos actos cognitivos. Nunca nada foi tão incompreendido como o seu ambitus desorganizador. A sua ordem é a ordem do avesso. Uma vez que caminha de encontro à imagin/nação. A Via Láctea. O inesperado. O que nos interpela in venire…
Na arte actual torna-se relevante a questão da depressão. É absolutamente exacto, e a poesia e o discurso político-ideológico actual o confirmam, que estamos confrontados com a emergência – no sentido mais genérico - de um paradigma depressivo. Isto é em parte assim porque a depressão é um estado inscrito na experiência profunda do ser contemporâneo. O huis clos do isolamento e a ruptura da intersubjectividade comunicacional deve ser tomado num sentido amplo, designando a hegemonia das dis-funções e o registro de uma constelação psíquica da personalidade neurasténica e esquizofrénica. Só que hoje, muito simplesmente, já ninguém crê na cartilha “surrealista” da libertação do inconsciente por meio da escrita automática. Ficou para trás a própria validade das vanguardas, marcadas pelo niiilismo e a subversão, no momento quem que assiste ao triunfo da estética e da época da “vaporização da arte”. Mas por degraus quase imperceptíveis acabou por se afirmar, ou pelo menos, ou enunciar o tema da vulnerabilidade (o informe, o inumano, o patético e, portanto, a concepção da arte como excreção) ou, precisamente, da relação catastrófica - apocalíptica - com o tempo.
Debilitamento
Numerosos factores contribuem para a aceitabilidade do paradigma depressivo ligado à essência mesma do moderno. Já ninguém crê nas promessas de felicidade. Nada mais nos satisfaz. A democracia “estabelecida”, “instalada”, ou “mercantilista” europeia, após um século, vê-se de novo repleta de excluídos e de novos escravos. É bem paradoxal ver que as nossas sociedades ricas e livres parecem também incapazes de exercer duravelmente uma influência emancipadora sobre o resto do mundo e, assim, o programa do consenso liberal e democrático. A experiência posterior à queda do muro de Berlim e da dissolução da URSS, em particular a partir dos anos 80, fez-nos cépticos face aos programas sociais ou políticos. Após a derrocada da razão utópica em nome da razão científica – a capitulação do colectivismo burocrático, por um lado, – e com o “fim das grandes narrativas”, anunciado por Jean François Lyotard em 1979, isto é, o desenvolvimento da democracia burguesa e da globalização - o mercado global que nos conduziu à era “pós-nacionalista” que se identifica com a sociedade da abundância à medida dos produtos de consumo, por outro lado, - já nenhuma doutrina política parece possuir o privilégio da “salvação”. Daí o fenómeno da excitação febril e embriaguez ainda em bases do “individualismo possessivo”. A ordem jurídica ocidental - converteu-se em máquina que perpetua as injustiças. Os aparelhos ideológicos e políticos vigentes já nem sequer legitimam uma aposta social precisa tendo em vista objectivos igualitários. Sabemos que o debilitamento das ideologias, o paternalismo e a retórica que há muito são parte da aura do poder político, inevitavelmente levam ao fatalismo e resignação histórica.
Cultura yupie
Não é necessário fazer um resumo minucioso. Embora imperfeito, nosso esboço é suficiente para estabelecer que estamos em plena emergência dessa economia de “casino”, com toda a especulação financeira e a formação de capital fictício (boa parte sem o lastro de qualquer crescimento real) mas também de uma cultura yupie, no sentido estrito, com os seus atavios de pequena nobreza. Aqui é preciso acentuar – com vista a ulteriores reflexões - a predominância de uma retórica obsessiva da competitividade internacional entre nações como se fossem empresas. Podemos, pois dizer que assistimos ao “fim da história”, no sentido definitivo das ideias liberais na política (democracia liberal) e na economia (capitalismo globalizado)? É importante verificar que o controle democrático – territorial – fundado no princípio da soberania do povo e um desencantado elenco de arranjos institucionais e regras – torna-se cada vez mais impotente face às forças multinacionais e internacionais da globalização. Isto significa também numa nova fase a difusão do american way of life ou da macdonaldização do consumo.
Docta spes
Muito embora o mercado como instituição-chave, o homo-economicus como modelo humano, o interesse próprio como motivação principal da acção, o individualismo como configuração triunfante recebam a menção favorável das nossas sociedades, não devemos esquecer que, como bem sugeriu Charles Taylor, existem “bens-constitutivos” que fundamentam nossas crenças e nos ajudam a implementar nossas opções. Tais bens formam parte de marcos valorativos que se desenvolvem na história. Porque falamos hoje comumente da fragmentação, da indeterminação e da intensa desconfiança de todos os discursos universais – ou para usar um termo favorito “totalizantes” (que são o marco do pensamento pós-moderno)? O que expressamente caracteriza a rejeição das meta narrativas ou das interpretações teóricas de larga escala pretensamente de aplicação universal? Quando nos deparamos, igualmente, ante a crise do pensamento iluminista? No entanto podemos e devemos – começar por referir que esta viragem não reflecte nenhuma mudança fundamental da condição social (porque, na verdade, por detrás do visível consenso liberal alguns problemas centrados na exarcebação da insegurança e da instablidade encontram abrigo na ordem colectiva). Nesta era do capitalismo tardio talvez estejamos em condições de elaborar uma visão realista e dramática do homem (onde se enobrece a cidadania moderna e o republicanismo, a utopia animada por uma docta spes). Nestas condições, como deixar de voltar a uma meditação sobre o horizonte ético e utópico, sobre o sentido de uma ética da compaixão, da libertação, da alteridade?
Catástrofe social
As desordens esquizofrénicas, o pânico, a ansiedade, o abuso de fármacos, o alcoolismo e a bi-polaridade exacerbam-se. Existem demonstrações convincentes e tangíveis de que em nossos dias a depressão assume, portanto, o perfil das tumultosas desordens psíquicas – tendo em conta o impacto da catástrofe social – que caracteriza a nossa cultura tardo-industrial. A reflexão sobre as figuras do deprimido e do pobre parecem não ter lugar na racionalidade moderna: eles embaraçam o mundo científico-técnico e o modelo económio neoliberal vigente. Escusado será dizer que o discurso científico e tecnológico escamoteando a figura do deprimido - relativizando-o - postula a “racionalização” para reconhecer a justeza e a validez da cultura tecnopolitana (a mercantilização). O historiador americano Immanuel Walerstein assinala estarmos a viver um “tempo de purgatório” – depois da extinção do wilsonismo e do leninismo - , mas pondo em evidência um tempo recheado de inúmeros problemas e de frequentes lutas carregadas mais de desespero do que de confiança. Tudo se quer privatizar: a saúde, a educação, as empresas públicas, a própria política. Apela-se aos grandes princípios do neo-liberalismo: a liberdade da empresa, a iniciativa privada, a competitividade, a maior produtividade, a agressividade comercial e a melhor qualidade de serviço (para os que podem pagá-lo).
Do in-habitual às causas perdidas
Num tempo de aceleração e de mobilização acelerada da experiência - e em que o “mobile phone” passou a ser parte de uma ideia de família, de intimidade, emergência e trabalho - a desordem social parece adquirida. Esta a situação de que teremos forçosamente de partir. A decantação, aqui apenas esboçada, permite-nos ver até onde e como a poesia – enquanto intentum estético-ético que resiste à communis opinio - pode ainda ser testemunho do nosso saeculum. A palavra secular provém do termo latino saeculum, significando “esta idade presente”. Não se pode ignorar que a poesia - contrapondo-se à luz meridiana da disciplina tecnopolitana actual e da sabedoria convencional -, pesar de muita retórica em sentido contrário, sempre alinhou com as “causas perdidas”. E, em notável grau, o in-habitual. Evidentemente: podemos considerá-la sob o ângulo da lógica do terceiro-incluído. Ou ainda: do delirium e da dementia: a exaustão do discernimento dos actos cognitivos. Nunca nada foi tão incompreendido como o seu ambitus desorganizador. A sua ordem é a ordem do avesso. Uma vez que caminha de encontro à imagin/nação. A Via Láctea. O inesperado. O que nos interpela in venire…
segunda-feira, 21 de setembro de 2009
Do “amor-paixão” e da poesia
Tudo conspira, hoje em dia, para mascarar a verdadeira natureza do “amor-paixão”. A tradição platónica do “Fedro” segundo a qual se torna necessário transpôr o amor dos belos corpos às das belas almas, o amor das belas almas à do bem supremo que não tem forma; o tema salomónico do amor humano, por causa da concepção do primeiro casal no “Génesis”; a história de Tristão e Isolda, do amor cortês (amante-cavaleiro e a sua dama ou domina) que opõe uma fidelidade independente do casamento legal, baseada no amor-único, esse mise-en-abîme, levam a pensar que o culto da paixão é talvez um dos exemplos que caracterizam a concepção do amor depois de séculos. Ninguém contestará que o “amor-paixão”, encarado como signo do impossível por Lacan, passou a ter uma significação transgressiva, libertária, libidinal. Parece-nos bastante evidente que a experiência do “amor-paixão” - situando-se para além da moralidade e legalidade - dita por si só a linguagem obscura do poesia. A poesia parece exigir, pelo menos explicitamente, uma assinatura-mundo a partir de Eros, as profundezas do demoníaco, onde a religião e o erotismo encontram as suas raízes mais secretas. A paixão – interdita, o amor inconfessável - , nunca deixou de confrontar-se com o indizível ou os chamados constrangimentos convencionais (os próprios “poderes”). E acaso será o amor (im)possível?
Dor, (des)possessão
Para se explicar o amor é preciso ir além do amor. Fausto exprime a decomposição do amor. Stendhal, Proust, Freud e Sartre exorcizaram a existência do outro: o amor na sua essência é um fenómeno solitário. Escusado será dizer que, segundo Kiergegaard, o casamento é o maior inimigo do amor: comporta o risco da repetição e do hábito. O amor feliz – enquanto reencontro e conversão recíproca – tal como foi formulado por Denis de Rougemont em seu livro clássico “O Amor e o Ocidente” – não tem história na literatura ocidental. Aqui deparamos com o grande achado dos poetas da Europa: a obsessão de conhecer através da dor. A noção doentia do amor recíproco infeliz – desafortunado – está, de alguma forma, presente em Pedro, o Cru, e Inês de Castro. É a história desse desejo de fusão mística que se opõe ao instinto de possessão. Viver, ser um indivíduo, não se define por um acto de apropriação. Sugere-se que o amor situa o ser amado na esfera do absoluto.
Insanus, demens
Podemos inclusive partir dos mecanismos do desejo que nos leva a concentrar a nossa atenção na mística e no erotismo que têm obscuras afinidades com o trágico e a morte. A catarse trágica, o êxtasse místico e o orgasmo erótico representam estados de espírito estreitamente aparentados. No entanto, pode-se constatar, que o amor cegante, ressacralizado e livre, – enquanto promesse de bonheur – não mudou no nosso contexto tardo-moderno. Não podemos, precisar, de início, o que seja a loucura amorosa sem nos sujeitarmos a cair num “círculo vicioso”. Quem é o insanus, demens? Demócrito e Platão afirmavam que ninguém seria bom poeta sem o sopro da loucura (ekstasis). O termo ekstasis significa “saída de si próprio”. A poesia supõe a inspiração, uma inspiração do poeta por uma força divina – Musa ou Apolo – ou um “fora de si”. Não tem o poeta a veleidade de se expressar através do amor? A poesia tende para um caos-cosmos enquanto tal: a nova língua. Não procura o poeta pensar contra a tradição, o consagrado e o já visto, o convencional?
Interfaces
Tudo conspira, hoje em dia, para mascarar a verdadeira natureza da poesia. Em tempos de “derrota do pensamento” (Alain Finfielkraut) é necessário, constatar, com efeito, a predominância da “estética da comunicação”. Pressupõe, bem entendido, a di - con - ssonância, a viagem, a contaminação e de, facto, as bifurcações por “interfaces”, os “vasos comunicantes”.
Poderíamos falar de um eventual “fim do período da arte” perfilhado por Hegel, quando, a partir da II Guera Mundial, surge um novo campo de pesquisa, a cibernética (kinernein= governo)? Ou de uma nova arte des-territoralizante por excelência, atentando hoje especificamente às tecnologias interactivas que nos colocam diante do pós-humano? Podíamos partir daqui para reflectirmos sobre a emergência da tecno-arte quando se insiste no carácter tumultuário – não adaptativo do poeta – que, frequentemente, se confronta com a ordem racional e monológica. Ou melhor: a opacidade, a (i)legibilidade, os afluentes desviantes. A poesia também significa pactuar com uma certa condição de exílio (o poeta não tem identidade: associa-se ao trauma, o evento ou o que falta). Poderíamos falar da psicose, da pulsão, da simbolização, da terapêutica da escrita poética? Da “loucura da linguagem” que, frequentemente, expressa o inexprimível? Justifica-se o prefixo trans quando falámos de poesia? O transe e o a-lógico? A cegueira e o tumulto? Poder-se-á dizer, com Horderlin, que “os poetas criam o permanente”. Ainda que pudesse parecer desejável, o permanente não consiste no invariável, o idêntico ao longo do tempo ou no que persiste em contínua presença. Poder-se-á assimilar a poesia ao inesperado, ao incontido, a algo convincente? Quem se dispõe à pronunciação que não cessa? Ao diálogo exigente? Como dizer algo “desenfeitiçando” a linguagem? Contrariando o óbvio, o pré-formado? O cárcere do tempo e da história, inultrapassável? Poderemos dialogar entre temporalidade e eternidade? Amorosamente?
Tudo conspira, hoje em dia, para mascarar a verdadeira natureza do “amor-paixão”. A tradição platónica do “Fedro” segundo a qual se torna necessário transpôr o amor dos belos corpos às das belas almas, o amor das belas almas à do bem supremo que não tem forma; o tema salomónico do amor humano, por causa da concepção do primeiro casal no “Génesis”; a história de Tristão e Isolda, do amor cortês (amante-cavaleiro e a sua dama ou domina) que opõe uma fidelidade independente do casamento legal, baseada no amor-único, esse mise-en-abîme, levam a pensar que o culto da paixão é talvez um dos exemplos que caracterizam a concepção do amor depois de séculos. Ninguém contestará que o “amor-paixão”, encarado como signo do impossível por Lacan, passou a ter uma significação transgressiva, libertária, libidinal. Parece-nos bastante evidente que a experiência do “amor-paixão” - situando-se para além da moralidade e legalidade - dita por si só a linguagem obscura do poesia. A poesia parece exigir, pelo menos explicitamente, uma assinatura-mundo a partir de Eros, as profundezas do demoníaco, onde a religião e o erotismo encontram as suas raízes mais secretas. A paixão – interdita, o amor inconfessável - , nunca deixou de confrontar-se com o indizível ou os chamados constrangimentos convencionais (os próprios “poderes”). E acaso será o amor (im)possível?
Dor, (des)possessão
Para se explicar o amor é preciso ir além do amor. Fausto exprime a decomposição do amor. Stendhal, Proust, Freud e Sartre exorcizaram a existência do outro: o amor na sua essência é um fenómeno solitário. Escusado será dizer que, segundo Kiergegaard, o casamento é o maior inimigo do amor: comporta o risco da repetição e do hábito. O amor feliz – enquanto reencontro e conversão recíproca – tal como foi formulado por Denis de Rougemont em seu livro clássico “O Amor e o Ocidente” – não tem história na literatura ocidental. Aqui deparamos com o grande achado dos poetas da Europa: a obsessão de conhecer através da dor. A noção doentia do amor recíproco infeliz – desafortunado – está, de alguma forma, presente em Pedro, o Cru, e Inês de Castro. É a história desse desejo de fusão mística que se opõe ao instinto de possessão. Viver, ser um indivíduo, não se define por um acto de apropriação. Sugere-se que o amor situa o ser amado na esfera do absoluto.
Insanus, demens
Podemos inclusive partir dos mecanismos do desejo que nos leva a concentrar a nossa atenção na mística e no erotismo que têm obscuras afinidades com o trágico e a morte. A catarse trágica, o êxtasse místico e o orgasmo erótico representam estados de espírito estreitamente aparentados. No entanto, pode-se constatar, que o amor cegante, ressacralizado e livre, – enquanto promesse de bonheur – não mudou no nosso contexto tardo-moderno. Não podemos, precisar, de início, o que seja a loucura amorosa sem nos sujeitarmos a cair num “círculo vicioso”. Quem é o insanus, demens? Demócrito e Platão afirmavam que ninguém seria bom poeta sem o sopro da loucura (ekstasis). O termo ekstasis significa “saída de si próprio”. A poesia supõe a inspiração, uma inspiração do poeta por uma força divina – Musa ou Apolo – ou um “fora de si”. Não tem o poeta a veleidade de se expressar através do amor? A poesia tende para um caos-cosmos enquanto tal: a nova língua. Não procura o poeta pensar contra a tradição, o consagrado e o já visto, o convencional?
Interfaces
Tudo conspira, hoje em dia, para mascarar a verdadeira natureza da poesia. Em tempos de “derrota do pensamento” (Alain Finfielkraut) é necessário, constatar, com efeito, a predominância da “estética da comunicação”. Pressupõe, bem entendido, a di - con - ssonância, a viagem, a contaminação e de, facto, as bifurcações por “interfaces”, os “vasos comunicantes”.
Poderíamos falar de um eventual “fim do período da arte” perfilhado por Hegel, quando, a partir da II Guera Mundial, surge um novo campo de pesquisa, a cibernética (kinernein= governo)? Ou de uma nova arte des-territoralizante por excelência, atentando hoje especificamente às tecnologias interactivas que nos colocam diante do pós-humano? Podíamos partir daqui para reflectirmos sobre a emergência da tecno-arte quando se insiste no carácter tumultuário – não adaptativo do poeta – que, frequentemente, se confronta com a ordem racional e monológica. Ou melhor: a opacidade, a (i)legibilidade, os afluentes desviantes. A poesia também significa pactuar com uma certa condição de exílio (o poeta não tem identidade: associa-se ao trauma, o evento ou o que falta). Poderíamos falar da psicose, da pulsão, da simbolização, da terapêutica da escrita poética? Da “loucura da linguagem” que, frequentemente, expressa o inexprimível? Justifica-se o prefixo trans quando falámos de poesia? O transe e o a-lógico? A cegueira e o tumulto? Poder-se-á dizer, com Horderlin, que “os poetas criam o permanente”. Ainda que pudesse parecer desejável, o permanente não consiste no invariável, o idêntico ao longo do tempo ou no que persiste em contínua presença. Poder-se-á assimilar a poesia ao inesperado, ao incontido, a algo convincente? Quem se dispõe à pronunciação que não cessa? Ao diálogo exigente? Como dizer algo “desenfeitiçando” a linguagem? Contrariando o óbvio, o pré-formado? O cárcere do tempo e da história, inultrapassável? Poderemos dialogar entre temporalidade e eternidade? Amorosamente?
domingo, 20 de setembro de 2009
O INOMINADO
- Quem se ajusta ao interminável - o inominado -
Nesse dizer do explícito - permanece na escuta -
Quem renuncia ao oblíquo - sobre a luz desavinda -
Num só momento retoma de vez o simulacro -
Da pintura - a intangibilidade da obra - o desmedido -
Quem se consome no penoso - como um possesso -
Reivindica o caos - a prosperidade do visível -
Quem perpetua a cada passo a escassez -
Da linguagem - na tela - carregada de sinais -
Sucumbe ao excessivo - a voz da constância –
Nesse dizer do explícito - permanece na escuta -
Quem renuncia ao oblíquo - sobre a luz desavinda -
Num só momento retoma de vez o simulacro -
Da pintura - a intangibilidade da obra - o desmedido -
Quem se consome no penoso - como um possesso -
Reivindica o caos - a prosperidade do visível -
Quem perpetua a cada passo a escassez -
Da linguagem - na tela - carregada de sinais -
Sucumbe ao excessivo - a voz da constância –
sábado, 19 de setembro de 2009
Le soleil dans le sommeil
Je vois du ciel – trop beau – le soleil devant mon sommeil- jusqu’a perde la raison – ses yeux – dans l’azur
Ton sommeil se pressent – faisait face au soleil – allait de tous parts cerner le mien
Se voile la face belle – doucement – tu resplendiras
Suis-moi – dans la folle mélodie – la passion – insondable – la rumeur des anges
Comment fixer - le plaisir – partager les mots assidus – aux confins du corp – le feu – dans la nuit
Si lentement ton regard – Qui va allumer ma lampe – et la respiration – le secret du jour en feu
Je veux atteindre – des murmures de l’eau – ce ciel – d’une voix – sensuelle – passionne
Qui cède aux chemins de la solitude – de l’aventure – attendre la musique du silence – le rythme du coeur?
Je contemple ses yeux avides – Qui me demandent mon secret qui t’appartient – halo d’or – insondable?
Que mes yeux vont plus loin – eclatant proximité de l’invisible – tu deviens secret – transmutes ma fureur
Révèles-toi – tu te rencontreras – dedans – subconsciemment
L’écho débordant – des heures insatisfaites – reve – d’une nymphe qui dormait dans le fond de la mer
Dans cette torpeur j’attends – le murmure magique – sa voix – à travers mes rêves
Laisse m’ennivrer du simple éclat – des yeux – le coeur veut s’illuminé – cette nuit
Je restais sans voix – consumée dans l’infini – puisses-vous ouvrir mes yeux d’adolescent – je demeure des nuits a t’esperer
Ta voix – jadis – troublait mon sang – avec des tentations aventureuses
Les couleurs d'eau

Les couleurs d’eau contiennent nos larmes – le désir – ce qui s’etonne de la mer
La couleur d’eau c’est comme la pluie qui nous traverse – encore à naître
Laisses-toi guider par la couleur sauvage – la plus indicible au point d’eau
Q’il soit ainsi ou presque – si lourd de ton – couleurs sans termes – couleurs d’eau – sans cesse
Le flux des couleurs – la profusion du feu – Qui te traverse – des eaux
Ta voix douce – c’est un parfum suave – qui s’ouvrait à moi
Je viens te dire le ciel bleu – vibrant – la splendeur inattendue – la voix au silence – revenue
Que je te vois sous le ciel chaud – touchant l’incendie – l’innatendue – ma bouche
La couleur d’eau reste – les larmes amères – est ce qui revient à celle dans la douleur
Aimes-moi – toute couleur – la voix – de la musique imminente
C’est ce que je veux c’est – ton coeur – à travers – le sommeil – plein
Une joie souterraine – de nuit complice – nue
De sentir ici – bas l’ange – le timbre – la voix qui arrive ou part – toi – les mots profonds en or
Sauvagement – toutes les couleurs – joies devenus traces
Tu transmues par la couleur la vie dans la vie
sexta-feira, 18 de setembro de 2009
Incêndio do corpo
I
Quem se aparta da memória
Na noite do esparso
A justeza do obscuro
Ilumina o que subsiste
Irreparável - incongruente - ?
II
Quem ignora o funesto
Retoma o dizer do incontido
O que se dissipa obscuro
No incêndio do corpo
Permanece inalterá...vel
III
A insistência da pedra
Sob o insaciável
O que incandesce
Quem se aparta da memória
Na noite do esparso
A justeza do obscuro
Ilumina o que subsiste
Irreparável - incongruente - ?
II
Quem ignora o funesto
Retoma o dizer do incontido
O que se dissipa obscuro
No incêndio do corpo
Permanece inalterá...vel
III
A insistência da pedra
Sob o insaciável
O que incandesce
quinta-feira, 17 de setembro de 2009
Ténue Fala
Fico horas e horas a escutar
A ténue fala dos dias pressentidos
Vou deslizando pelo silêncio unânime
Estranha e doce noite a pedra inesgotável
Junto ao que incendeia que beleza acena?
Quem ilumina minha voz insaciada?
Quem se detém pelo in...apreensível?
Junto da avidez clama por presença
Perpetua a memória do incomparável?
A ténue fala dos dias pressentidos
Vou deslizando pelo silêncio unânime
Estranha e doce noite a pedra inesgotável
Junto ao que incendeia que beleza acena?
Quem ilumina minha voz insaciada?
Quem se detém pelo in...apreensível?
Junto da avidez clama por presença
Perpetua a memória do incomparável?
Falésia
Entre as tendas da praia - junto à falésia - no rasto da luz prateada – recorro à memória. Que se me evoca o pátio: a árvore do júbilo. Vêem-me à tona as imagens da porta entre-aberta. Ante o atelier de cézane - vislumbrei os quadros - o chão de lages escurecido – e as tuas pálpebras escurecidas. Anos mais tarde regressei à velha torre - de pedra e cal. E ao longo da duna – vi o acaso rubro sobre o mar verde e os relâmpagos reflectidos. Da próxima vez, demorar-me-ei. Dir-te-ei a cláusula celeste. O que se repercute na voz em meio às naves.
Reconstrução
Ardor
Passaram tantos anos
O respeito parece um bem escasso
Aqui estás tú exilado e eu não soube
Que à vida juntavas o ardor
A liberdade do que mais importa
Alinhado entre estranhos
Sou eu que te acompanho agora
Quando voltas?
O respeito parece um bem escasso
Aqui estás tú exilado e eu não soube
Que à vida juntavas o ardor
A liberdade do que mais importa
Alinhado entre estranhos
Sou eu que te acompanho agora
Quando voltas?
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