sábado, 28 de novembro de 2009

A INDECIBILIDADE, O ALTO


- PUNCTUATED EQUILIBRIA
1.

Não me escrevas - deslumbra - meu corpo que se desdobra -

Junto a Shelley - a veracidade da demência - em Rotterdam - minha vocação da penúria - inconfessada -

Sou o Circum Mundo - o Alto - que não vês - o Quantum Chaos - a confrontação - o incessante -

Desde a Suméria até Sefarad - já conheci o êxodo - a falácia do verbo - indispensável -

Sou espanto desnudo do caminho - Epiménides - a nuvem herética - o ininterrupto -

O rumor de um largo escrito - na orla da noite - a partitura iluminada -

Sou o prado e a cabra luminosa - o que sussurra - a boca muda de Riemann -

A voz que prescinde dos números primos e a trepadeira imóvel - no Vale de Loire -

O indemonstrável - o penhasco e o osso - Gramsci - um cervo ferido -

Sou o canto indizível - num espectro de pedra - um diagrama antigo - Asclépio - Hermes - Serápio -

Uma luz sonolenta e o orvalho inconsistente - o céu a descoberto -

A neve e a erva dócil junto da cisterna - a música do incorrigível -

Sou a abóbada e a nave do incêndio - Notre Dame - os partigiani -

Cada manhã - sob a voz obscura que finda - Kurt Godel -

2.

Sou a verdade e a mentira - a indecidibilidade - o sétimo mandamento -

O éter e o jovem Euclides enlouquecido - o chapéu de David Hilbert -

Por sobre o bosque ermo - o relâmpago - sob os carvalhos -

Apenas vejo o vago e o fugaz - quando o incêndio espreita -

Sobre a cúpula da catedral - o impenetrável Charles Sanders Peirce -

3.

Sou o corpo inabalável - de Kavafis - um jovem inerme e sonânbulo - o frenesi do anónimo me possui -


Imune ao deserto – o pueril – a urgência estética – meu coração se detêm -

Quem se atreve a renunciar – cede ao que clama – o jovem Kafka – a erva e o vento – o alusivo -

Persiste no ópio - a fala minuciosa e a escuta - a voz do lúcido – a inconsistência -

Quem em Palo Alto - renuncia aos dias futuros - a equação do impróprio - a quebrada luz -

Do esplendor - se apressa - sobre o mar - confinado ao desejo e a ímpia nudez - o grito ocre -

Quem cerrando os olhos - permanece perante o impossível - no desamparo metafísico -

Sobre a cisterna - a lâmpada - os lábios do sedento - ?

4.

Sou a cláusula celeste - a voz do prematuro - o Brahma - Nada Absoluto -

Permaneço nesse êxtasse - a convulsão - junto a Emily Dickinson - a Via Láctea -

Sou o mapa - o relâmpago – a música do contraditório – o não – e – a intangibilidade -

Rendido ao alento da loucura - junto ao muro da inexpressão - escuto o vazio - que tudo inclui - Caravagio -

Na língua do silêncio - o som primigénio - na noite - de John Cage -

O relinchar do potro - no ar - o sal desnecessário - a circunferência sobre o orvalho -

Sou a Arca da Aliança - a pedra inclassificável - o clinâmen - o precipício distinto -

Na incumbência do deserto - o que se desmorona - incendeia -

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

BODE - RELÂMPAGO - ALTA VEREDA ESCURA

- RÉSTIA DO BRANCO

1.
sob o bosque de névoa - o relâmpago - junto do regato - inacessível - para lá da escarpa - um bode saltitante - abeira-se do abismo - despenha-se - do alto -

2.
aqui a vereda escura e turva nuvem - o descampado - que me cobre - a nave - hermética - da insónia -

3.
o âmago da pedra sobre nada - o som do ignoto - um bafo ecoando - na neve -

4.
perco-me na réstia do branco e o orvalho furtivo - a montanha - o resplendente pêlo - os chifres sem nome - na noite - suas órbitras piedosas -

5.
sobre o augúrio - a sombra endemoniada - que acena sobre o que incendeia - uma árvore desbastada -

Porto, 26 Novembro 2009

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

O INOLVIDÁVEL GATO

- SILENTE

O inolvidável gato – persa - espírito aclarado - se distende - sobre o meu peito - defronte ao cabalete - súbito no branco - da tela - a orla da noite - altivo - permanece - silente - através da luz - no atelier - em esboço - vou filtrando sua impávida retina - concentrada -

PITAGÓRICA TRAMA

- DO IRRESOLUTO

Quem emerso no irresoluto - se expõe - no branco - ouro e azul -

Permanece pelo apaziguado - a premeditada geometria -

Pitagórica trama - flama – força e desvelo - sombra amena -

Faz brotar a luz - a voz do prolixo – o imerso corpo - da pintura -

Na constância da pedra desnuda - a nave - fixa o inexplícito

Junto ao que se dissipa - ténue brilho - a divina proporção -

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

O CORPO, SONO LEVE

- VOZ DO INSOLÚVEL
1.
diz-me o que assoma na retina - ténue luz – desfocada - sobre o branco da tela - a nudez reflectida - imagem após imagem - a música e a pedra - inacessível -?
2.
contemplo o que se esvai - no traço - do áreo - tua oculta fisionomia - o corpo - sono leve – que me incendeia - a voz do insolúvel - o que ascende -

O CORPO SOBRE A LUZ EMUDECIDA

- O IMPONDERÁVEL

1.
sob o que cessa - o incisivo corpo -

junto ao que tarda - o que se esvai -

na pedra sobre a luz emudecida

2.
o branco que aflui e ilumina a voz

- do imponderável - quando te despes -

o ímpeto da beleza - inapreensível - ?

Porto, 23 Outubro 2009

terça-feira, 17 de novembro de 2009

O ALTO DA MONTANHA, A CABRA

- O INDESCRITÍVEL

1.
Por trás do brilho da pedra - a luz do inexorável -

O alto da montanha - o ilimitado - que a céu aberto se perfilha -

A neve espessa - que assoma na retina - indescritível -

Sobre a nuvem - o musgo - uma cabra - reflectida -

2.
No abismo - de mansinho roçando - eu vi-te - em fuga - junto à lâmpada imóvel -

Pelo desfiladeiro - o azul do aéreo - na despercebida encosta - do exausto -

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

DO ALTO AS NAVES

- NO RASTRO DO TÁCITO

1.
Que pedra desliza - do alto cume - ignoro -

O voo da ave - o que desaba - nas nuvens -

Meu chão de lages – as cabras - sobre o incêndio -

2.
O que nos circunscreve às naves - a noite inacessível -

O branco - a cal dos frontispícios - a própria voz furtiva -

No rastro do tácito - ao invisível – o que não cessa -

Porto, 16 nov. 2009

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

ÎLE SAINT-LOUIS

Je me retourne souvent – sur Paris et son île – les yeux – surtout les yeux – la voix – ce feu – Qui nous hante

Je ne sais pas oublier la voix – la respiration – ô flamme – le mal au coeur

Je marche solitaire – en fumant – au dessus de l’eau – la pluie – les jours des jours – j’essais de te retrouver

terça-feira, 10 de novembro de 2009

O FRÉMITO DA PALAVRA OBSTINADA

SOB AS ARCADAS, A CONVULSÃO DO AÉREO

1.
transpondo a voz - de robert browning - a desmedida do incêndio - o que vacila -

na orla da noite - pela intempérie - súbita a clarividência do excesso -

2.
junto ao parapeito da janela- um odor salino - dissolvendo-se - o sono austero - o redobrado alento - da nudez -

o que se furta ao incontido - nos sinais do anónimo - a veemência do pleno -

3.
sob as arcadas - a sobriedade da erva e o premente corpo - a pedra do desvaste -

o relâmpago - onde me precipito - o que se furta ao dizer - na língua do exausto - os gerânios -

4.
o êxtasse - inacessível- animal que invoco - o assíduo olhar - nos confins do longínquo

- a música do inóspito - a convulsão do aéreo - o abutre e a cisterna -

5.
ante a lucidez do inexplícito - o que subsiste pelo ininterrupto - se evola no branco - o que assoma no tremor - pela cegueira do exímio - o frémito da palavra obstinada -

6.
pelo alto da falésia - o que se entrelaça - no vento e na água - as constelações do esquivo -

o azul do céu - interminável - o musgo inconsolável - uma rã sumindo-se -

O CLARÃO DO ABAT-JOUR

- A VOZ DO SOLÍCITO


a voz do solícito e o corpo do irrepreensível

na noite humedecida o clarão do abat-jour

junto da parede branca a indolência da neve

o sussuro do irreprimível coração e as nuvens

sobre o orvalho a timidez quando a luz desponta

o anjo infinito impassível que resvala no exausto

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

CAMPO DI FIORI

giordano bruno

1.
junto do céu largo em campo di fiori

vislumbrei a agonia de giordano bruno

o incêndio e a inanição sobre as nuvens

o clamor do hediondo e o instante funesto

2.
há muito apreendi o tremor que o céu cala

silencioso e trémulo permaneço sem alento

um indescritível pavor me ensombra a alma

a prudência reclama a língua da estranheza

3.
como hei-de eu enfrentar a astúcia e a mentira

perdoando aos que exultam a auctoritas divina

lacônicos julgam sobriamente a voz do sagaz

4.
no rasto do que se expande o crime se mantém

o absurdo mata de novo e a arrogância ascende

Porto, 6 Novembro 2009

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

LINGUAGEM DO SILÊNCIO

entre as túlipas deslizo imperturbado na voz humecida o inflexível corpo

torno-me esquivo emerso na linguagem do silêncio e quiçá da morte

rendido ao arcano maior do tarô as imagens do anónimo escuto schoenberg

sobre a erva me reclino na luz pelo canto matutino o sono denso o rastro do imensurável

adormeço cada noite sobre as marés no branco que enlouquece a pedra incandescente

ante a música do irrecuperável perco-me na boca sequiosa a areia branca e intranquila

visualizo o odor febril e doce no esgar da nudez permeço à tua espera absorto

por sobre o intransferível transporto o fulgor do ininterrupto o alarme das nuvens e isso é tudo

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

VOZ HUMEDECIDA

Entre as túlipas deslizo imperturbado na voz humedecida

Torno-me esquivo emerso na treva

Rendido ao arcano maior do tarô

Sobre a erva me reclino o canto matutino

Adormeço no branco a pedra incandescente

A música no esgar da nudez à tua espera absorto

Por sobre o fulgor da luz o alarme das nuvens